Justin Trudeau: “As redes sociais que são irresponsáveis vão sofrer”

Crédito: João Tomé

Presidente do Canadá anuncia medidas legislativas que podem chegar a vários países mundiais para evitar discurso de ódio, transmissões como a dos ataques na Nova Zelândia, desinformação (fake news) e interferência em eleições. O Dinheiro Vivo / Insider está no evento de tecnologia VivaTech, em Paris.

“Temos de melhorar a confiança na internet para que a tecnologia possa fazer a diferença para melhor e não para pior”. O popular presidente do Canadá, Justin Trudeau, está determinado em criar legislação e regras que tornem o atual ambiente digital “caótico e sem regras claras”, num espaço onde se possa viver e conviver “sem medo”. 

A sua entrada no palco principal do VivaTech, evento rival da Web Summit, motivou o primeiro momento de entusiasmo no público presente no centro de exposições de Paris.  Trudeau, que falou em inglês e francês em partes diferentes do discurso, anunciou algumas medidas concretas que o Canadá vai implementar nos próximos meses, algumas foram discutidas aqui em Paris ontem, no evento Online Extremism Summit, para desenvolver novas medidas após os ataques terroristas da Nova Zelândia (transmitidos no Facebook Live e no YouTube). O evento privado teve presentes vários governos e os líderes do Twitter e Facebook.

“As pessoas estão a perder a confiança na internet, nos seus dados e na segurança que têm online e isso tem de mudar”. Trudeau acredita que terão de ser tomadas medidas para regular o mundo digital mais ou menos concertadas pelos governos a nível mundial, mas admitiu que o Canadá “está a liderar o processo dando já o exemplo com novas medidas”. 

“Antes eram os governos que tinham as ferramentas para regular a sociedade, agora os cidadãos vivem cada vez mais num espaço digital que não é regulado e isso cria problemas graves. Temos de garantir que as pessoas podem confiar na sua presença online e não podemos apenas culpar pessoas como o Mark Zuckerberg, temos de regular e ajudar o espaço tecnológico a evoluir, mas por um bom caminho”.

Quais medidas? Trudeau garante que o Canadá “está a subir a parada e a guiar esse caminho”. “Estamos a criar um digital chanter, um guia que envolve entidades públicas e privadas para que haja um acesso universal, transparente em tudo o que é tecnológico para restabelecer a confiança digital nos cidadãos e exigir responsabilidade às plataformas online”.

“Ódio e extremismo prosperam online!”

Trudeau não esteve com meias palavras. “É preciso dar luta ao facto do ódio, extremismo, bullying e desinformação terem conseguido crescer online, protegidos pelo anonimato na internet e onde poucos conseguem fazer barulho como se fossem muitos”. O presidente canadiano continua, indicando que a retórica nas redes sociais “tornou-se tóxica e comentários online que nunca toleraríamos nas nossas ruas são agora frequentes”. “As plataformas online tornaram-se num local bom para extremistas incitarem à violência e estrangeiros influenciarem eleições alheias, é nossa obrigação moral denunciar e dar luta”.

Embora o Canadá já tenha tido algumas iniciativas, em conjunto com a ONU, para “lutar contra o terrorismo online, inclusive dos neonazis, até porque o radicalismo que leva à violência”, Trudeau quer fazer mais e para isso quer ir além do discurso de ódio e vai criar nos próximos meses o que chama de Digital Charter.

A desinformação “também prejudica a confiança online” e o líder usou o exemplo do Facebook, que é a principal fonte de notícias atualmente no Canadá. “Há notícias falsas virais que manipulam as pessoas, ao ponto de 6 em cada 10 millenials admitirem que já foram vítimas de fake news e espalhar essa desinformação aumenta a falta de coesão na sociedade”. 

Daí Trudeau anunciar o aumento de cursos no Canadá em literacia digital de uma forma global, “para que todos percebam a reconhecer as falsidades virais”. O tema está ligado à intromissão em eleições e foi criado um gabinete no Canadá para dar resposta a isso.

“Serão os canadianos a escolher o seu governo”

O presidente do Canadá quer responsabilizar as plataformas. “Temos eleições já em outubro e criámos uma nova task force para identificar tentativas de interferência estrangeira online e a polícia está agora preparada para isso. Os anúncios com mensagens políticas pagos com fundos estrangeiros vão ser proibidos durante as eleições nas várias plataformas e as plataformas vão ter guardar o registo dos anunciantes durante a campanha eleitoral. Só os canadianos é que vão escolher o seu próximo governo, vamos garantir isso!”

Neste contexto, Trudeau garantiu: “as plataformas online como as redes sociais têm de se comprometer, têm de respeitar a responsabilidade que têm e vamos avançar  com vários medidas concretas nos próximos meses para isso acontecer, quem não cumprir vai sofrer e ter de pagar um peso muito pesado”.

O líder explicou ainda que “a vida privada está em risco online”, dando o exemplo do escândalo no Facebook, que começou com o Cambridge Analytica e não tem parado com dados pessoais usados ou para fins políticos ou comerciais de forma abusiva por várias empresas, inclusive por motores de busca e bancos. “É inaceitável esta violação dos dados constante e há maior preocupação porque os dados dos utilizadores é detido por poucas plataformas hoje em dia”. Os canadianos vão ter mais ferramentas e possibilidades de gerir os seus dados nos próximos meses, “vão poder mudar os seus dados de uma plataforma para a outra e ter a garantia real que podem retirar os seus dados por completo de uma plataforma, se o desejarem”.

A Digital Charter canadiana vai incluir regras de anticoncorrência mais apertadas e “vão guiar o regulamento do uso de dados que poderá ser aplicado a nível mundial no futuro”, para poder “reformar as leis de privacidade e dar resposta ao poder incrível e para a presença destas plataformas nas vidas dos cidadãos”. 

Seguiu-se um apelo aos governos do planeta: “todos os países devem ter uma estratégia global digital e é preciso criar as ferramentas certas para navegar na esfera digital, com uma intervenção mais determinada porque as pessoas também o exigem”. “Ao aumentar a confiança no mundo digital, podemos ter melhores bancos, pesquisa melhor, melhor medicina, melhores negócios e excelentes oportunidades para todos. A tecnologia liga-nos uns aos outros como nunca e torna as nossas vidas mais fáceis, daí ser preciso restaurar confiança e colocar as pessoas primeiro”.

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