Reportagem: A ‘magia’ do pequeno livro que define a cultura Outsystems

OutSystems,
Proença-a-Nova. Centro de desenvolvimento da OutSystems. (Fernando Fontes / Global Imagens )

A Outsystems tornou-se em junho no segundo unicórnio português (vale mais do que mil milhões de dólares). Há um pequeno livro que não só explica a cultura que tem permitido tornar a empresa no fenómeno de simplificar a programação de software, como ajuda a tornar-se apetecível para o talento tecnológico. 

[O tema de capa da revista Insider do mês de julho é, precisamente, a forma como os dois unicórnios portugueses – Farfetch e Outsystems – estão a mudar as nossas vidas através da tecnologia.]

A sul da sede da Farfetch – cuja cultura de captar e reter talento já falámos aqui -, fica o segundo unicórnio português, a Outsystems, que está a crescer e contratar (este ano serão mais 250), embora com menos fulgor do que a energética Farfetch. Como empresa há mais anos no mercado (tem 17 anos), a Outsystems também segue a cultura alimentada pelo seu CEO, Paulo Rosado, ao ponto de haver um livro de regras que serve também para cada um perceber se tem ou não estofo para ser um dos escolhidos.

Paulo Rosado nos escritórios da Outsystems em Linda-a-Velha, em entrevista para a reportagem da revista Insider.
(Orlando Almeida / Global Imagens)

A empresa recrutou alguém só para o chamado employer branding – uma espécie de marketing ou cultura de empresa para tornar as empresas atrativas para o cada vez mais procurado talento. O mesmo aconteceu em abril com a Farfetch, que passou a ter alguém com esse cargo. Alexandra Líbano Monteiro, diretora da área de recursos humanos (People Success) e há sete anos na empresa, admite que há uma “guerra pelos melhores engenheiros”, mas “as pessoas entusiasmam-se quando chegam até nós e percebem como funcionamos, a grande dificuldade é mesmo passarem a conhecer a Outsystems”.

O pequeno livro das regras entregue aos novos funcionários da Outsystems e que existe há 10 anos.

Um dos segredos do sucesso na hora de contratar é a cultura da empresa, reunida num “pequeno livro das grandes regras” para quem entra na empresa. “Há quem se cruza pelo Small Book e quer trabalhar num contexto assim” (pode ler o livro em inglês neste link).

Paulo Rosado explica-nos o segredo do tal livro, feito apenas porque há cerca de 10 anos, quando começaram a entrar mais pessoas na empresa, “fizemos um exercício de colocar a cultura, que tínhamos construído desde início, em texto para os novatos perceberem”. A empresa foi criada para criar algo “fora da caixa”, por isso tinham de ter “pessoas para contribuir” e por isso tanto foco no perguntar sempre porquê e pode ser um funcionário ao seu chefe ou pessoas de departamentos diferentes.

“A coisa mais estúpida do mundo é contratar uma pessoa esperta e dizer-lhe tudo o que ela tem que fazer.”

Paulo Rosado, CEO da Outsystems

Vimos um dos tópicos presentes no livro, o “Responde ao Paulo”, acontecer à nossa frente na sessão fotográfica para a nossa reportagem. O CEO da empresa perguntou ao jovem Bruno o seu nome, o que fazia na empresa e o que estava a fazer naquele momento.

A cultura do low code, da simplificação, também está no ADN da empresa e está no livro, de forma a evitar-se “o jargão” e comunicar de forma simples com os colegas. Alexandra Líbano Monteiro admite que a nível cultural “aqui e na Holanda podemos ser transparentes e dar feedback negativo a um colega, nos EUA não funciona da mesma maneira”.

Escritórios da Outsystems, em Linda-a-Velha. (Orlando Almeida / Global Imagens)

Outra prioridade para Paulo Rosado é a satisfação em geral da sua equipa: “Sempre nos focamos muito em criar um ambiente, onde as pessoas pudessem ter vidas gratificantes”. Até porque “passamos um terço do dia a trabalhar, em 35 a 40 anos de vida útil e não queremos ser parte de um processo que traz miséria à vida das pessoas – há muitos ambientes tóxicos por aí”.

E aqui ficam os três pilares para ter pessoas motivadas, por Paulo Rosado (onde não entra o dinheiro):

  • “Têm de ter objetivos claros;
  • têm de ter autonomia
  • e têm de mostrar que são bons numa coisa e isso é possível num sistema de gestão em que se delega e todos participam nas decisões”

O líder da Outsystems entusiasma-se e continua: “O gestor não diz como se vai fazer, pergunta como se pode atacar o problema”. Daí dizer que “a inovação vem de baixo para cima aqui, porque temos uma cultura que permite o erro, as pessoas não podem ter medo de experimentar, só assim se tornam mestres”.

Rosado quer uma empresa com pessoas que gostam de vir trabalhar. “O que motiva pessoas inteligentes, como as que queremos, não é o dinheiro, é haver uma direção clara do que se quer e ter as pessoas a concordarem com as decisões”. Daí que Rosado admita que transformar software que era “muito chato” para todos em algo mais alegre traz “um karma muito positivo”.

Tudo isto, para Paulo Rosado, “é muito difícil de fazer”:

“Requer alterações drásticas a nível de gestão. Precisa de estar mesmo no core da empresa. Nós queremos fazer as coisas assim, por isso temos o Livro das Regras. Grande parte disto é feito com hábitos concretos, um deles é o Ask Why, o perguntar porquê, que é fundamental para definir e alinhar o propósito e executar a noção de autonomia.”

E como é que a Outsystems está a atrair bons engenheiros? “Atraímos porque estão a trabalhar em coisas de topo, interessantes e veem o impacto no mundo, estão a trabalhar com colegas ao mesmo nível ou melhores do que eles, têm autonomia para tomar decisões, podem errar sem levarem na cabeça e crescem mais rapidamente aqui do que cresceriam noutro sítio”.

(artigo feito com a colaboração de Cátia Rocha)