Na autoestrada 101, que liga São Francisco a Silicon Valley, o trânsito é caótico 24 horas por dia. No território do globo com mais empresas tecnológicas por metro quadrado, o trabalho não tem horários e os sonhos não têm limites. A Insider foi conhecer a capital mundial da inovação, onde o secretismo anda de mãos dadas com o espírito de partilha.
Foi terra que sempre deu frutos. Antes de Steve Jobs plantar a maçã em 1976 já Silicon Valley era o pomar da Califórnia. Do vale de Santa Clara, como era conhecido antes da revolução tecnológica, dizia-se que era um dos melhores lugares do mundo para cultivar alperces e laranjas. Ainda hoje não faltam árvores no vale do silício. É atrás delas que se escondem as empresas que controlam a nossa vida.
“Ali existia uma igreja, hoje é uma startup”, aponta Janice Holliday, guia turística nascida e criada em Palo Alto, uma das 14 cidades de Silicon Valley. E quem diz uma igreja ali diz uma escola aqui, um hospital ou um quartel de bombeiros acolá. “As tecnológicas tomaram conta de tudo aqui à volta”, conta a guia, sem ponta de crítica no discurso.
Ou não fosse ela própria filha da indústria. Começou como telefonista e mais tarde pôs a mão na massa enquanto operária numa fábrica de componentes eletrónicos. Em Mountain View, onde completou a primária, os livros da escola foram substituídos por gigabytes infinitos de matéria. A Google é dona do bairro.
Na Charleston Road perde-se a conta ao número de edifícios de logo colorido estampado. Todos baixinhos, no máximo 15 metros de altura, como de resto é lei (contestada) em várias cidades do Valley.
Em 2020 haverá mais um, o Charleston East, que, para já, não passa de um esqueleto. “O Googleplex é gigantesco. Os funcionários da Google vão de bicicleta até às paragens de autocarro da Google”, conta a guia. O que de resto faz parte da filosofia das grandes tecnológicas. “Há muitas que têm autocarros gratuitos. Se o funcionário não tem de conduzir, ganha tempo para trabalhar durante o trajeto casa-trabalho.”
O único problema que as gigantes criaram no vale, diz Janice, foi a bolha imobiliária. “Não existem casas a preços acessíveis”, explica a guia enquanto aponta para uma moradia de dois andares em Palo Alto. “Aquela foi comprada por 22 milhões de dólares.” O recorde pertence a uma mansão na mesma zona que está à venda por 97 milhões.
A vizinhança terá contribuído para a loucura. Basta descer alguns quarteirões para chegar à casa onde Steve Jobs passou os últimos anos, na qual ainda resta um jardim coberto de macieiras. “Bill Gates costumava visitá-lo e era frequente vê-lo a passear o cão”, lembra Janice Holliday. Uma casa azul com baloiços à vista é a morada de Marissa Mayer, ex-CEO da Yahoo. O próprio fundador do Facebook, Mark Zuckerberg, é um dos proprietários das redondezas, tal como Tim Cook, atual CEO da Apple.
O bairro é o mesmo onde em 1938, numa garagem pintada de verde, William Hewllet e David Packard criaram um oscilador de áudio e davam origem, sem saber, a Silicon Valley. O número 367 da Addison Avenue é agora um museu privado onde ainda se fazem reuniões da HP, a primeira startup da história.
Hoje, são mais de 34 mil as que tentam vingar no vale da baía de São Francisco. “Mais de 70% não têm sucesso, mas aqui valorizam-se os falhanços, porque significa que houve uma tentativa. Há um espírito muito grande de partilha que contrasta com o secretismo natural da indústria”, destaca Janice. “E é isso que faz deste um lugar especial.”
Veja na galeria de imagens acima onde fica a inovação por aquelas paragens.
A jornalista viajou a convite da Galp.
*Este artigo foi originalmente publicado na revista Insider número 3, de setembro/outubro de 2018.