Web Summit em Portugal, de 2 a 4 de dezembro, vai usar a mesma plataforma de conferência online testada esta semana na Collision e que pusemos à prova. Software começa a ser licenciado a outros eventos este verão. Por saber está em que pé ficam os 11 milhões de euros anuais que Portugal paga.
Era suposto ser em Toronto, Canadá, pelo segundo ano consecutivo, mas em pleno ano de pandemia a Collision (que passou a Collision from Home) foi feito na íntegra online, tendo como espaço milhares de casas espalhadas pelo mundo – 32.630 participantes de 140 países, 630 oradores, mais de mil startups, mil jornalistas e 850 investidores. A conferência de tecnologia da América do Norte que pertence à Web Summit foi um teste para o evento de Lisboa, adiado para dezembro e que, sabe-se agora, será online e offline (híbrida, portanto).
Sobre a Web Summit 2020 ficámos a saber que a parte presencial será, à partida, para os oradores – “só em outubro as autoridades dizem se haverá ou não público”, diz Paddy Cosgrave. Daí que o evento passe a contar com estúdios que irão além da capital: “queremos mostrar que Portugal é mais do que Lisboa e podemos estar no Porto, Coimbra, Faro ou até nas ilhas”. Os preços para o público online já estão disponíveis – custam entre €99 e €999 (acesso VIP) – e, em vez dos habituais 70 mil participantes presenciais, são mais de 100 mil os ingressos disponíveis para a versão online.
E como é, então, a experiência? Um misto de rede social ao estilo LinkedIn, speed dating profissional, conferências de imprensa e webinares por Zoom, tudo na mesma plataforma de web app (a app móvel é um acrescento para gerir a agenda). A equipa de engenharia da Web Summit liderada pelo português João Soares mostra, assim, toda a capacidade das apps nos navegadores web.
A área central é a de conteúdos vídeo, a Watch. Temos três canais de vídeo (ou palcos) com as típicas conferências (formato online e caseiro), tendo ainda entrevistas mais longas na opção rádio, conversas de eventos anteriores e a área dos workshops – alguns oradores partilham os seus conhecimentos.
Em cada uma destas áreas é possível conversar sobre o canal em questão com outros participantes e ver quem está em linha e até interagir – é ainda possível reagir com emojis ao que se passa. Mais surpreendente é a zona Breakout, onde é possível aderir a salas de conversação temáticas, ter acesso a conferências de imprensa ou a sessões Q&A, de perguntas e respostas, com os oradores – “foi esta a área com sucesso mais surpreendente”, diz Cosgrave.
No segundo dia de evento ficou disponível a área do chamado Mingle, uma espécie de speed dating (encontros rápidos) de três minutos onde podemos interagir com participantes ao acaso – nunca sabemos quem vem aí. E é uma modalidade muito prometedora, especialmente num evento onde a maioria das pessoas está mais disponível para comunicar e partilha alguns interesses – além de haver uma contagem decrescente dos 3 minutos, podemos ver a ‘ficha’ da pessoa (quem é, que cargo tem e em que empresa), o que permite quebrar o gelo e podemos avaliar se a conversa correu bem ou mal. Também há ícones para denunciar abusos de participantes mesmo em conversas privadas, por exemplo.
A última zona é a Explore, ou Explorar e permite outros participantes e oradores, startups e parceiros, mas tinha ainda algumas áreas por desbloquear. Grosso modo, apesar de várias soluções interessantes e criativas, a plataforma evoluiu de dia para dia inclusive com ferramentas novas que foram testadas, mantendo ainda assim alguns bugs (problemas) ocasionais, mas que no último dia já não eram incomodativos ou frequentes.
“Não podiam ser apenas vídeos de conversas de Zoom entre oradores, o nosso foco é criar networking e experiências parecidas com o evento offline, mesmo que nada o substitua”, diz-nos Cosgrave, que acrescenta: “já fomos contactados por outras conferências e eventos para usarem o nosso software e devemos começar a licenciar em breve”. Há, assim, um novo negócio em perspetiva, algo que até estava na génese da Web Summit logo em 2009 e 2010, o de licenciamento de software para organização de eventos – isso mesmo disse-nos Cosgrave numa entrevista no verão passado.
Certo é que aparentemente há interessados de outras conferências em usar o software, mas também de empresas e organizações em geral (ONU incluída) e, admite Cosgrave, pode servir já este verão os partidos políticos nos EUA para organizarem os seus comícios.
Dos 32 mil participantes registados, era normal ‘encontrarmos’ 3 mil a 3800 no Canal 1, o principal, mais de duas mil pessoas no Canal 2 e acima das mil no Canal 3. Depois, dependendo do orador disponível – houve vários famosos – na área de Q&A (perguntas e resposta), à hora certa, era possível fazer perguntas diretas por mensagens escritas que eram respondidas na hora.
Das pessoas com quem falámos – várias, ao longo do evento – a nota geral é que mesmo não substituindo uma conferência presencial, a plataforma permite uma aproximação peculiar entre os participantes e que outras plataformas já usadas noutras conferências não conseguem. Os elogios eram nota dominante, mesmo que vários lamentassem os bugs iniciais e admitissem – especialmente os das pequenas startups – que se dedicavam mais a fazer contactos e a conhecer pessoas na plataforma do que a assistir aos conteúdos vídeo.
Através da área Mingle conversámos (durante 3 minutos de cada vez) com pessoas da Suécia, Argentina, Roménia, EUA, Canadá e até do Alasca, quase todos responsáveis de pequenas startups em busca de apoios, mas disponíveis para uma conversa desinteressada. A maioria estava surpreendida pela eficácia da plataforma. Os elogios também chegaram da imprensa especializada norte-americana, com a Digital Trends a dizer mesmo “Collision from Home é o espantoso futuro das conferências online“.
Cosgrave admite ainda ter suspirado de alívio pelo feedback “muito positivo” dos últimos dias tanto de participantes, como de parceiros e até outras conferências: “estes dias foram de grande aprendizagem e correram melhor do que o previsto e a plataforma ainda vai melhorar, agora com mais seis meses de trabalho até à Web Summit”.
Os principais oradores: de Tedros a Justin Trudeau
Como é habitual nos eventos da Web Summit, o Collision mesmo totalmente online teve, a partir de suas casas, nomes relevantes do contexto atual internacional que vão além de responsáveis das áreas tecnológicas – pelos palcos/canais passaram especialistas de 25 indústrias diferentes.
No primeiro dia o destaque foi para o diretor-geral da Organização Mundial de Saúde, Tedros Adhanom Ghebreyesus, que pediu ajuda com responsabilidade e ética aos responsáveis tech para por a tecnologia ao serviço da humanidade e contra os efeitos do vírus. Também houve a fundadora do Huffington Post, a icónica Arianna Huffington, a escritora Margaret Atwood e a estrela (já retirada) da NBA Shaquille O’Neal.
Não faltaram responsáveis relevantes de Microsoft, Google, Twitter, bem como Paris Hilton, Hope Solo ou o filho de Nelson Mandela, Siyabulela – isto num evento que terminou na quinta-feira com o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau.
O que fica por perceber da Web Summit 2020?
Ainda há muitos pormenores práticos para se saber sobre a Web Summit ‘natalícia’ de dezembro, a maior parte só será respondida após outubro. É nesse mês que as autoridades portuguesas (Governo e DGS) devem indicar se é ou não possível ter público numa parte presencial do evento e quantas pessoas em concreto. O que parecem garantidos são os 100 mil participantes online (se todos os bilhetes forem vendidos) e os oradores e moderadores devem estar presencialmente em Portugal – pelo menos é isso que a organização prevê – para emissões em estúdio espalhadas por cidades portuguesas.
O que ficou por esclarecer pelo CEO e fundador da Web Summit foi se há mudanças no valor que Portugal tem contratualizado para pagar anualmente – 11 milhões de euros. Parece certo – por causa da pandemia – que o valor estimado de ganhos para o país de 300 milhões de euros pela presença da Web Summit em Lisboa não se deverão manter, que mais não seja pela ausência dos 70 mil visitantes habituais (mesmo que haja uma parte do evento presencial, dificilmente serão o número habitual devido à pandemia. Na conferência de imprensa de quarta-feira, Cosgrave disse mesmo que não sabia.
Já o município de Toronto também não esclareceu se houve mudanças no valor acordado com a organização e, no caso de Portugal, só em outubro (ou até mais perto do evento) se saberá se pode ou não haver público presencial, o que pode ter influência em possíveis mudanças no acordo estabelecido.
Evento irmão da Web Summit testa nova tecnologia de conferências online