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O líder da Web Summit aceitou o desafio do Dinheiro Vivo/DN Insider e respondeu às dúvidas de 10 jovens estudantes sobre o futuro na próxima década. E ainda deixa a porta aberta para ajudar a criar um programa para formar jovens durante todo o ano.  (pode ouvir no final toda a conversa em formato audio)

A ideia era simples. Paddy Cosgrave, o irlandês empreendedor de sucesso, fundador e CEO da Web Summit, rodeado de 10 estudantes portugueses de áreas diferentes. O ponto de partida? O evento nascido em Dublin em 2010 – desde 2015 decorre em Lisboa – vai ficar mais 10 anos na capital portuguesa (110 milhões de euros de investimento) e os 10 jovens da Universidade Nova de Lisboa teriam de fazer questões que refletissem as suas preocupações para a próxima década. Paddy aceitou o desafio do Dinheiro Vivo / DN Insider sempre de sorriso nos lábios e disponível para saciar a curiosidade dos jovens, dias antes do seu evento mais precioso – “o nosso Mundial” – começar. Tudo isto decorreu na manhã desta sexta-feira).

Antes das perguntas dos jovens, falou-nos dos tempos em que estudava na Irlanda e foi presidente da Sociedade de Filosofia, “com 330 anos”. Ocupou o mesmo cargo de Bram Stoker, o autor de Drácula, e Oscar Wilde também tinha pertencido à organização. Também admitiu que gosta de ler depois de acordar de manhã. Livros? “Sim, mas também trabalhos académicos científicos”. Curiosidade não lhe falta. E falou do seu desinteresse pelo uso de fato, mesmo junto às maiores figuras. “Gosto de me vestir de forma simples”, explicando que políticos e empresários provavelmente gostariam de abandonar o fato, que também vê como “uma espécie de armadura”. “Tinha um fato que raramente usava que perdi num hotel da Coreia do Sul há cinco meses, tenho de comprar outro”.

Sobre a Web Summit 2018, revelou ter ficado surpreendido com a quantidade de canadianos a participarem. “Temos muitos brasileiros, mexicanos, mas nada bate os canadianos este ano”. Comentários à parte, surgiram as perguntas dos jovens de áreas que vão da engenharia, às finanças, passando pelo marketing, ciência política, direito internacional ou jornalismo da Nova de Lisboa, ávidos por conselhos.

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O jovem José Barradas, aluno de engenharia, começou com um desafio para que Paddy e a sua equipa ajudem o ano inteiro jovens alunos portugueses a crescer. “Vejo com bons olhos podermos participar na criação de uma sociedade ou grupo que ajude os estudantes portugueses todos os dias do ano e não apenas alguns na Web Summit”, disse Paddy, lembrando que há limites para o que podem fazer. Mas considerou importante mudar um pouco mais a mentalidade das pessoas, incluindo dos pais. E deu o exemplo da Irlanda, onde os pais por vezes limitam os filhos por não perceberem as novas profissões como ciência computacional ou a criação de startups desde tenra idade.

Startups falham mas também surpreendem

Já sobre a preocupação de Rui Roldão, estudante de finanças, sobre a possibilidade da maioria das startups falharem, Paddy lembrou que existirem mais empresas a nascer é positivo, “mas o desafio é conseguir fazer mais empresas como as Farfetch, Outsystems ou Feedzai, que são verdadeiros catalisadores do crescimento”. Paddy sugere que exista “transferência de conhecimento” destes empreendedores que são agora um novo exemplo e que cujas empresas têm feito “portugueses especializados regressarem ao país e poderem continuar a evoluir nas carreiras”. E aí “as universidades devem beber desses novos exemplos”.

As novas questões relacionadas com a inteligência artificial (IA) foram outro dos temas falados. Paddy admite que “há um hype maior do que é a realidade” e citou um especialista do MIT para mostrar que há um exagero nas promessas feitas que estão a superar em muito o que é a realidade. “Temos tempo agora para filosofarmos sobre IA e pensar no impacto negativo, mas aconteceu algo semelhante com os carros, quando chegaram há 100 anos não havia carta de condução nem semáforos e hoje continuam a surgir novas regras”. Ou seja, para Paddy, com o desenvolver da tecnologia vão surgir naturalmente as regras e “para isso precisamos de todos, filósofos, engenheiros, advogados, políticos e investigadores”.

Eu só tinha 8 horas de aulas por semana na universidade e isso dava-me liberdade para conhecer outras coisas, para me envolver noutros aspetos da universidade e aprender de outras formas”. Foi assim que, “sem saber, estava a aprender competências de como trabalhar numa equipa, com outras pessoas, tornar ideias em realidade e a falhar muito”

Margarida Vila Luz, aluna de gestão, quis saber sobre quem vai singrar no mundo das fintech, numa altura em que as regras de privacidade (com o RGPD) também têm influencia. “Essa é a pergunta de um milhão de dólares”, disse Paddy, lembrando que pequenas startups de fintech que estiveram na Web Summit há três ou quatro anos e foram desvalorizadas por muitos como a Revolut ou a N26, hoje estão a revolucionar a forma como pagamos por bens. “Nunca sabemos quais são as startups que vão vingar, mas não podemos desvalorizar”, disse o líder da Web Summit que admitiu que a banca também já sabe inovar e “em Portugal e noutros locais são quem mais contrata engenheiros”. “Vai ser uma luta entre bancos antigos e startups novas e somos nós quem vai beneficiar”.

Falou-se ainda de jornalismo, de como está em crise “mas há sinais de esperança com as novas plataformas, cada vez mais baratas e acessíveis” – “as barreiras e o custo para distribuir artigos, reportagens e mensagens nunca foram tão baixas”. Sobre a tecnologia, lembrou que é na génese neutra, “depende sempre como é aplicada”. E lembrou o filósofo francês Descartes: “ele opunha-se à impressão, porque iria permitir a proliferação de livros falsos ou simplesmente maus, mas as suas preocupações eram exageradas”. Resumindo, Paddy coloca o fardo da responsabilidade de a tecnologia fazer bem ou mal na sociedade.

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A forma como se ensina nas universidades foi outro dos temas. “As empresas privadas têm uma agenda escondida quando criticam com facilidade o ensino nas universidades”. Paddy diz mesmo que nos EUA (e também noutros países), a maior inovação depois da II Grande Guerra Mundial veio sempre do setor público (onde inclui os militares) e das universidades. “As empresas, depois, tratam de colocar as inovações em produtos”.

E o que devem os jovens fazer com o seu tempo na universidade? “Boa parte de uma boa educação é treinar-te para pensares”. E deu o seu exemplo: “eu só tinha 8 horas de aulas por semana e isso dava-me liberdade para conhecer outras coisas, para me envolver noutros aspetos da universidade e aprender de outras formas”. Foi assim que, “sem saber, estava a aprender competências de como trabalhar numa equipa, com outras pessoas, tornar ideias em realidade e a falhar muito”. Foi assim que também percebeu que as suas ideias “nem sempre são as melhores” e “as ideias de uma equipa superam muitas vezes a de um indivíduo”.

(O vídeo em cima é um resumo de 14 minutos do que se passou nos 45 minutos de conversa entre Paddy e os estudantes. Se quiser ouvir a conversa completa em formato de som, onde o líder da Web Summit faz uso da sua experiência para traçar alguns cenários sobre o futuro das universidades, da inovação e da tecnologia, pode fazê-lo de seguida)

AGRADECIMENTOS:

Ao Paddy Cosgrave, aos estudantes participantes, à Universidade Nova de Lisboa (nomeadamente a Nova SBE e à Venture Labs) e ao VIP Executive Art’s Hotel.