Depois de ter ficado em baixo durante tempo recorde, em março, o Facebook (e os serviços que lhe pertencem Instagram e WhatsApp) voltou a ter problemas este fim de semana. Quais os motivos para tantas falhas? Ao contrário do que aconteceu no passado, Facebook não explica mas mudanças profundas recentes podem estar por trás das paragens.
Quando o Facebook e as suas empresas associadas ficam em baixo é notícia mundial e um problema que afeta 2,5 mil milhões de utilizadores (existem 4,3 mil milhões de utilizadores com internet) e vários milhões de anunciantes. Este fim de semana, apenas um mês depois do maior apagão da principal rede social do planeta, o Facebook (tal como o Instagram e WhatsApp, que lhe pertencem) voltou estar em baixo. Desta vez pouco mais de duas horas. Para a maioria todos os serviços ficaram inoperacionais, tal como há um mês.
Em março foi preciso esperar 24 horas para que tudo ficasse sanado e a rede social anunciasse, curiosamente, no Twitter, que já estava tudo operacional. Este foi um recorde absoluto de serviço em baixo para a rede social que, desde que 2008, quando tinha apenas 150 milhões de utilizadores, que não tinha uma paragem tão significativa.
O que tem surpreendido nestas paragens de serviço é o facto de estarem a ser bem longas e com pouco espaçamento. Antes passavam-se vários meses até haver uma paragem relevante e, por norma, aconteciam mais focadas num dos serviços e não nos três principais que pertencem ao Facebook.
Ataque ou problemas internos, o que se passou?
Em março, após a paragem recorde de 13 e 14 desse mês, o Facebook garantia que ao contrário do que indicavam alguns boatos, não se tratava de nenhum ataque DDoS (ou ataque de negação de serviço), que costuma visa tornar um servidor ou uma infraestrutura indisponível. A paragem não anunciada “foi o resultado de uma mudança na configuração dos servidores, que levou a vários problemas a aceder às nossas apps e serviços”. Algo pela qual o Facebook pedia desculpa. A explicação dada foi muito breve (sem desenvolvimento em mais nenhum lado) e sem qualquer dado sobre países e utilizadores afetados.
Yesterday, as a result of a server configuration change, many people had trouble accessing our apps and services. We've now resolved the issues and our systems are recovering. We’re very sorry for the inconvenience and appreciate everyone’s patience.
— Facebook (@facebook) March 14, 2019
Com mais anunciantes e utilizadores do que nunca, uma paragem no Facebook tem custos vários para diversas entidades, ao ponto das ações da empresa terem caído durante a longa paragem de março. No entanto, a paragem global deste domingo já não teve nem explicação oficial, nem pedido de desculpas.
Esta aparente desvalorização da paragem contrasta com situações semelhantes do passado. Em setembro de 2010, após uma paragem de 2h30, o Facebook colocou um dos seus responsáveis, Robert Johnson (que já saiu da empresa, entretanto), a explicar as razões técnicas daquela que, na altura, era a maior paragem em mais de quatro anos (o que demonstra que as paragens estão mais frequentes do que nunca).
Publicado por Facebook Engineering em Quinta-feira, 23 de setembro de 2010
Dizia Johnson que o sistema automático para verificar valores de configuração tinha sido reparado, mas a emenda tinha sido pior do que o soneto e provocou mais problemas do que aquele que era suposto resolver. O responsável explica depois, com pormenor, o que se passou, para também indicar que se tinha aprendido algo com o problema. Tudo isto era explicado na página Facebook Engineering, que nunca mais entrou em pormenores sobre problemas nos serviços nas plataformas.
Em 2010, o Facebook era uma empresa de 600 milhões de utilizadores, com 1,9 mil milhões de receitas vindas da publicidade online. Hoje o Facebook é dona do Instagram e WhatsApp, a empresa tem 2,5 mil milhões de utilizadores ativos mensais e tem 55 mil milhões em receitas vindas da publicidade online – em conjunto com a Google aglomera 86% do bolo total do mercado publicitário online mundial (excluindo a China).
Ou seja, o Facebook tem mais responsabilidades mundiais do que nunca, mas nunca deu tão poucas explicações sobre as paragens no seu serviço – contatámos o Facebook ibérico para esclarecimento, mas até ao momento ainda não obtivemos resposta.
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Mudança de estratégia, integração de serviços e conflitos
As mudanças nos algoritmos e na plataforma do Facebook são muito frequentes, mas é bem mais raro haver paragens globais significativas. Para perceber o modus operandi do Facebook e o que poderá estar por trás desta paragem é preciso olhar para os anúncios recentes em torno da empresa de Mark Zuckerberg.
O CEO da empresa que comanda Facebook, Instagram e WhatsApp viu partir nos últimos tempos várias pessoas relevantes. O seu amigo e braço direito do ponto de vista de produto, o CPO Chris Cox, anunciou a saída precisamente em março, o mês da pior paragem na história da rede social. Cox, sem levantar ondas, admitiu que a empresa está a seguir um caminho que não é o seu. Já o ano passado tinham saído da empresa os fundadores do WhatsApp e do Instagram, claramente em conflito com os novos desejos de Zuckerberg em concentrar cada vez mais no próprio Facebook os outros serviços como Instagram e WhatsApp – colocando o que eram plataforma independentes, cada vez mais interligadas e a remeter para o Facebook.
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No início de março, alguns dias antes da maior paragem da rede social, Mark Zuckerberg confirmou uma notícia de janeiro e admitiu que vai mesmo integrar todos os serviços de mensagens da empresa, do Messenger ao Instagram, passando pelo WhatsApp. A ideia passa também por encriptar todos os serviços de mensagens e juntar as suas funcionalidades.
Essas podem ser mudanças que estão a complicar os servidores e os vários serviços da empresa Facebook, acreditam alguns especialistas ouvidos pelo The Verge. A 14 de março um editorial desse mesmo site escrito por T.C. Sottek deixava a pergunta: “Porque uma falha enorme na empresa mais influente do mundo é tratada como mais um dia no escritório?” Os seus responsáveis citam depois o responsável de segurança do Facebook, que garantia em março que a empresa “é a infraestrutura crítica para a democracia dos tempos modernos”.
Nesse contexto, são indicados vários pedidos de esclarecimentos do próprio The Verge e do New York Times ao Facebook, que nunca foram atendidos, numa estratégia bem diferente do que se viu no passado do ponto de vista de dar esclarecimentos.
Indica o The Verge que, “o que é mais alarmante no segredo do Facebook em torno desta paragem é que a empresa é conhecida pela sua obsessão por estar sempre ativa e disponível”. O site especializado deixa depois duas questões, já que nunca conseguiu os esclarecimentos pedidos: “se o Facebook não consegue ser honesto e frontal nos factos mais urgentes e básicos sobre a sua própria existência, como podemos confiar na empresa e como podemos levá-la a sério?
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