Neil Armstrong, o piloto-cientista perfeito para o primeiro passeio lunar 

Calmo, humilde, piloto exímio, engenheiro, astronauta focado e um praticamente geólogo pronto para tirar da Lua o que era preciso. Neil Armstrong, o primeiro ser humano a pisar a Lua sob o olhar da astrobióloga portuguesa, Zita Martins e do próprio.

Aos 38 anos e com uma vida de guerras (a da Coreia), proezas incríveis como piloto e engenheiro aeronáutico e alguns traumas de vida (perdeu uma filha com dois anos), Neil Armstrong, um dos astronautas mais talentosos, competentes, humildes e preparados, acabou por ficar na linha (com alguma dose de acaso, de acordo com o própria) para ser o primeiro homem a caminhar na Lua.

Como se pode ver no filme First Man (2019), que se inspira na sua biografia oficial de 2005 – Armstrong nunca viu o filme, morreu em 2012 – o homem complexo, piloto exímio, engenheiro e uma espécie de cientista-geólogo graças à formação que recebeu na NASA, acabou por ser a escolha perfeita. Pouco impressionado com a fama do cargo de astronauta, viveu a tentar ficar bem longe da fama incrível que obteve (tornou-se num dos homens mais conhecidos do planeta), ao ponto da família de Armstrong o tenha descrito como um “herói americano relutante”.

Estávamos a 20 de julho de 1969 e, depois de uma promessa em 1961 do presidente John F. Kennedy, e com a Guerra Fria com a Rússia ao rubro a levar a uma autêntica corrida ao espaço, a missão Apollo 11 tinha partido da Terra a 16 de julho. O objetivo? Por o primeiro homem a caminhar na Lua, no que seria não só um marco simbólico na história da humanidade, mas também uma expedição científica que nos ajudou a perceber a origem da Lua. 

Neil Armstrong e Buzz Aldrin deixaram o colega Michael Collins no chamado Módulo de Comando na órbita lunar e partiram no Módulo Lunar até à superfície lunar. O sangue frio do comandante da missão, Armstrong foi vital no momento que o própria mais temia, a aterragem lunar. Um erro no computador da nave levou o piloto a assumir os comandos do aparelho e, a olho, procurar o local com menos rochas e fora de uma das crateras lunares.

A aterragem ocorreu pelas 21h17 minutos de dia 20 de julho de 1969. Foi aí que Armstrong disse as palavras, “Eagle has landed (a águia aterrou)”. O comandante da missão só saiu do Módulo Lunar seis horas e 39 minutos depois, já era madrugada de dia 21 em Portugal – 1h56 da manhã (Buzz Aldrin juntou-se ao comandante 19 minutos depois). A missão teve ainda o condão de ser transmitida pela televisão e pela rádio para um número recorde de casas na Terra: estima-se que 600 milhões de pessoas assistiram ao vivo, graças à existência recente de satélites que permitiram a transmissão do que se passava a 384 mil km da Terra.

Como se pode ver na entrevista no final do artigo, Armstrong garante que só pensou nas palavras que ia usar quando desse o primeiro passo na Lua – tornando-se assim no primeiro ser humano a fazê-lo – quando já estava no Módulo Lunar a caminho da Lua. O famoso “one small step for [a] man, one giant leap for mankind (um pequeno passo para o Homem, um passo gigante para a humanidade).”

 

O astronauta admitiu mesmo que existiam vários receios sobre o sucesso da missão por possíveis imprevistos. “Na minha cabeça tínhamos 50% de hipóteses de aterrar em segurança na Lua e 90% de hipóteses, depois disso, de sair de lá inteiros”.

Na verdade, existia mesmo já um discurso escrito para o presidente norte-americano, Richard Nixon, a lamentar a possível morte dos astronautas, com a NASA a ter receio de que mesmo que eles aterrassem lá, pudessem depois não conseguir sair.

Depois disso, os dois astronautas estiveram duas horas e um quarto a explorar aquilo que Buzz Aldrin descreveu inicialmente como a magnifica desolação, pela vista incrível e pelo facto do corpo celeste a que damos o nome de lua onde abunda o pó lunar ser completamente seco. Além de algumas homenagens a astronautas, russos e americanos, que morreram ao serviço dessa luta pelo espaço, tinham um caderno de encargos enorme e pouco tempo disponível. Porquê? A NASA tinha receio que os seus fatos espaciais não aguentassem o calor extremo (pode atingir os 200 graus) da Lua. Recolheram 21,5 lg de material lunar e passaram um total de 21 horas e 31 minutos na superfície lunar, num local chamado Base Tranquilidade, antes de se juntaram ao Módulo de Comando Columbia, onde estava Michael Collins.

Curiosamente, a bandeira que Neil Armstrong e Buzz Aldrin deixaram na Lua – não foi fácil colocá-la na superfície lunar, que além de muito pó fino (por vezes o pó torna-se numa espécie de vidro) tem rocha por baixo -, foi derrubada pela propulsão da própria nave ao partir. As missões seguintes já tiveram outro cuidado relativamente ao local onde colocar a bandeira.

A ciência e geologia depois do primeiro passo

A reputada astrobióloga portuguesa, reconhecida a nível internacional, Zita Martins, explica-nos algumas das vantagens de ter em Armstrong uma figura tão focada na parte científica da missão Apollo 11. 

“Futuras missões espaciais tripuladas vão beneficiar muitíssimo com a presença de pelo menos um geólogo, ou astronautas que tenham tido formação intensiva de trabalho de campo com geólogos. Um exemplo disso aconteceu com Neil Armstrong que recebeu treino na NASA por parte de geólogos de forma a prepará-lo para o cenário real da Lua”. 

A especialista, que já passou pelo Imperial College, em Londres, e voltou agora para o Instituto Superior Técnico, em Lisboa, admite que “a presença de geólogos nesse tipo de missões espaciais permite uma escolha rápida e acertada das melhores amostras a recolher, cuja análise fornece informação crucial sobre a Lua.”

Para a especialista, há uma combinação perfeita na formação e características de Armstrong para a missão. “Ele teve uma formação única para a época: professor Universitário, formação em aviação, teve formação na NASA em geologia, e licenciou-se em engenharia aeronáutica. Isto foi uma combinação única que lhe permitiu chegar à Lua e saber o que fazer, que amostras recolher”. 

Claro que só o feito inédito de conseguir aterrar na Lua “já seria extraordinário”, mas depois disso “era preciso saber o que fazer e o que trazer de volta à Terra de forma a garantir que se tinha informação suficiente e representativa, nessa época ele era a pessoa indicada para tal responsabilidade”.

Alguns desses feitos científicos estão retratados com pormenor neste reportagem do New York Times, intitulada: Neil Armstrong: First Man on the Moon, and Its First Great Geologist.

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A importância da Lua

Está a 384 mil km da Terra, mas no cômputo do espaço é o nosso vizinho mais próximo. Atualmente é mesmo visto como o ponto de partida para a exploração espacial poder rumar até Marte. Elon Musk, conhecido apaixonado pelo espaço, onde investiu boa parte da sua fortuna com o projeto SpaceX, não tem dúvidas em dizer que, para ele, o dia 20 de julho de 1969 foi o mais significativo para a humanidade até à data. É o evento da história humana que permitiu, pela primeira vez, que um ser humano saísse da Terra onde todos os humanos nasceram e foram criados e pisasse solo de outro corpo celeste que não a Terra.

E a Lua não é um objeto qualquer. Todos os dias qualquer pessoa no planeta tem oportunidade (dependente da posição e do tempo) de observar aquele objeto que parece tão grande, face aos outros no céu, incluindo o sol. 

(Entrevista de 2005 no 60 Minutes)

O investimento gigantesco, graças à Guerra Fria

Foram investidos nas missões Apollo, de 1961 a 1972, um valor inédito de 25,4 mil milhões de dólares, o equivalente hoje a 153 mil milhões – a NASA investiu na altura mais mais do PIB português atual, o que seriam hoje cerca de 250 mil milhões. Foi esse um dos motivos pelo qual os EUA conseguiram cumprir a promessa de Kennedy, de por um homem na Lua antes do fim da década de 1960.

Foi esse também um dos motivos porque desde 1972 e após 17 missões Apollo que colocaram 12 homens na Lua, nunca mais houve humanos no satélite natural terrestre. Isso mesmo é referido por Armstrong na entrevista que colocamos por baixo, onde elogia mesmo o esforço russo.

Na verdade, em seis aterragens lunares foram trazidos 381 kg de rochas e material lunar, incluindo o peculiar pó que preenche todo o satélite natural, que tem 27% do tamanho da Terra.

Armstrong, como é possível ver na entrevista seguinte de 2011, ficou sempre com a esperança que a presença do ser humano na Lua se mantivesse e aumentasse em anos seguintes. Mas viu a esperança cair por terra. Já depois da sua morte, a NASA tem novos objetivos de voltar à Lua já em 2024.

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