Reportagem na fábrica da multinacional Bosch, em Braga, para conhecer o seu novo projeto de Indústria 4.0 com tecnologia RFID para digitalizar todos os processos, que promete mudar a relação com os consumidores. Veja o vídeo.
Chama-se RFID, tem mais de 40 anos e é uma tecnologia que permite identificar de forma automática objetos por radiofrequência – o exemplo mais atual é as passagens de carros pela Via Verde. Depois de muitos anos algo esquecido, o RFID (do inglês “Radio-Frequency Identification”), surge de novo como um método acessível e barato para digitalizar as operações. É essa tecnologia que a Bosch está a utilizar desde outubro passado na sua maior fábrica em Portugal, em Braga.
É lá que a empresa produz sistemas multimédia para automóveis e motos de mais de 100 marcas, da Land Rover à BMW. Também se produzem sensores vários e os chamados eCall das motas (chamadas de emergência). A fábrica também se orgulha de ter sido a primeira a produzir ecrãs curvos para os painéis de instrumentos na indústria automóvel e ter feito o primeiro cluster (painéis de instrumentos em formato ecrã) que a Rolls Royce usou nos seus carros.
A ‘magia’ acontece na antiga fábrica de autorádios da Blaupunkt. Numa zona industrial de Braga, saem dali os sistemas multimédia e painéis de instrumentos de veículos para o mundo inteiro. Foi ali que ficámos a conhecer como a Bosch quer usar o RFID para digitalizar todos os seus processos.
O projeto faz parte da segunda fase da parceria de inovação “Innovative Car – Human Machine Interface (IC-HMI)” da Bosch com a Universidade do Minho, que conta com o apoio financeiro da União Europeia e envolve 30 projetos de investigação científica, cerca de 400 colaboradores e um investimento global de 54 milhões de euros.
Voltando à fábrica, vive-se por ali um ambiente vibrante com muitos funcionários e uma azáfama constante. A empresa passou de 1500 pessoas em 2014 em Braga, para as quatro mil em 2018. Nem de propósito, a Bosch inaugura esta semana novos edifícios, já que a empresa está a crescer em Portugal com vários projetos tecnológicos e de desenvolvimento na área do interior dos veículos do futuro, com sistemas multimédia cada vez mais adaptados aos carros semiautónomos e autónomos. Além disso, também se explora por ali a comunicação em tempo real entre veículos, fundamental para a era de veículos-robô.
Para entrarmos no espaço fabril temos de colocar um fato especial, com botas especiais para evitar qualquer descarga de energia. O espaço principal da produção de sistemas multimédia está dividida em mais de uma centena de zonas para cada marca de automóveis de motos, por cima de cada área de produção está o símbolo da marca, como Audi, Volkswagen ou Rolls Royce. Há, depois, espaços de acesso remoto e exclusivo, onde não pudemos filmar já que o segredo, mesmo nos sistemas multimédia dos automóveis, é a alma do negócio.
Digitalizar, confiar, pagar menos
A nova era da digitalização da produção beneficia do RFID, mas também de outras aplicações associadas. Pedro Vaz Silva, responsável de inovação logística e indústria 4.0 da Bosch, explica-nos que o chamado track and trace, “a rastreabilidade das pessoas, desde o fornecedor à fábrica vai fazer toda a diferença para empresas e consumidores no futuro”.
A Bosch criou uma ferramenta precisamente para fazer isso, chamada iFloW, que segue a matéria prima desde a origem, passando pelo fornecedor até chegar à Bosch Braga. Essa ferramenta de integração que permite gerir stocks e necessidades venceu do PEL – Projeto de Excelência Logística 2016 e foi um dos 5 finalistas do ELA – European Logistic Award 2017.
No caso do RFID, Vaz Silva explica que, no fim de contas, “é uma forma fácil de digitalizar tudo o que diz respeito às fábricas e vai revolucionar a eficiência, aumentar a produtividade, evitar as perdas de stocks, tornar os preços mais baixos para o consumidor e dar-lhe uma maior confiança sobre aquilo que consome”. Porquê? “Porque vai ficar a saber com pormenor de onde veio aquilo que comprou”. Ou seja, o cliente final vai saber o percurso da matéria prima ao produto acabado e “isso traz uma maior fiabilidade”.
Pedro Vaz Silva lembra que “vivemos numa sociedade que quer cada vez mais personalização e adaptabilidade”, daí que o cliente “compre cada vez mais um serviço e a digitalização ajuda muito nisso”. O consumidor pode, muito bem, optar por um produto sobre o qual sabe mais, de onde veio e que tipo de segurança no processo produtivo teve. “Assim, podemos garantir uma maior qualidade e segurança do produto e o cliente tem acesso a essas garantias num processo mais transparente”, explica.
Como exemplo, Vaz Silva fala do exemplo da venda dos automóveis. O grupo Volkswagen já tem exemplos que permitem ao cliente, através de uma app e do uso de tecnologia de RFID, monitorizar o percurso e etapas de produção do seu carro e, inclusive, acompanhar a viagem que o carro faz até chegar à sua casa. “É o tracking do produto levado ao ponto que traz mais conhecimento e informação ao cliente”, avança o responsável de inovação.
Outro exemplo de utilidade desta rastreabilidade é quando, por exemplo, uma peça de um produto dá problemas. “Se o turbo ou um airbag de um carro (muitos têm vários fornecedores diferentes) der problemas, muitas vezes é difícil identificar que fornecedor é que fez o produto defeituoso, mas com esta digitalização de todas as peças, será mais simples perceber de fonte do problema”.
O Grupo Bosch diz ser um dos pioneiros a usar a tecnologia do RFID em Portugal – já se usa em algumas lojas e alguns aeroportos. “No mercado português ainda não há consultoria nesta área, o que é pena, por isso, estamos a trabalhar num projeto para capacitar os nossos fornecedores de peças com esta tecnologia”, explica Vaz Silva.
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RFID, simplicidade ao estilo Via Verde
Para nos ajudar a perceber como tudo funciona, o responsável da implementação do RFID na fábrica, António Maio, acompanhou-nos pela fábrica para explicar o processo que é bem mais barato do que, por exemplo, o uso de Bluetooth. Agora são usadas etiquetas RFID em cada caixa, identificando de forma rápida o que está em cada uma delas com a ajuda de um leitor, ao estilo leitor de códigos de supermercado.
A partir daí, as caixas entram no sistema normal de transporte da fábrica mas, ao passaram por uns pórticos que funcionam como já se vê com os carros ao passarem na Via Verde, o sistema fica a saber em que zona é que elas estão, permitindo a tal rastreabilidade. As peças entram depois numa estrutura, a que chamam de supermercado, que abastece as linhas de montagem, num sistema que também permite saber quando há peças em falta de forma mais eficiente e em tempo real – a nossa reportagem-vídeo explica bem este processo que contribui para diminuir os erros de alocação de peças, sabem onde está o material e evitam os desvios de stock.
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