YouTube celebra 14 anos com Artigo 13 à espreita. ‘Should I stay or should I go?’

A diretiva dos direitos de autor já tem texto final e inclui o famoso Artigo 13, que o YouTube tanto critica. A plataforma faz 14 anos e tudo indica, vai mesmo continuar na Europa, pode é ter de abrir os cordões à bolsa e bloquear mais conteúdos.

Às 21h13 de dia 14 de fevereiro de 2005 (em Portugal eram 5h13 de dia 15 de fevereiro), na Califórnia, era feito o registo do site youtube.com. Chad Hurley, Steve Chen e Jawed Karim criaram a plataforma, que desde 2006 pertence à Google, para poder ter acesso a vídeos como o do nipplegate, quando o mamilo de Janet Jackson ficou a descoberto.

Passados 14 anos, o YouTube é a principal plataforma de vídeos a nível mundial e, com a nova diretiva dos direitos de autor da União Europeia, a plataforma e os seus criadores, os youtubers, acreditam que tudo vai mudar (para pior) graças ao artigo 13. Alguns dos especialistas com quem falámos têm uma visão bem menos catastrófica.

O YouTube na Europa “está ameaçado”, tal como “o meio de sustento de centenas de milhares de pessoas” e “músicas como Despacito vão deixar de poder estar na plataforma pela complexidade dos seus direitos de autor”. Quem o diz é Susan Wojcicki, a CEO do YouTube. A plataforma de sucesso inegável que ainda recentemente lançou o serviço de música pago YouTube Music e, em Portugal, já tem a app YouTube Kids fez mesmo uma previsão que assustou os seus criadores: “se o artigo 13 for aplicado, mais de 35 milhões de canais europeus do YouTube vão ser bloqueados”.

Wojcicki indica que é tudo uma questão de responsabilidade legal que, com o artigo 13, passa a ser sempre da plataforma, nem que algo com direitos de autor (e sem acordo de licenciamento pago pela plataforma) fique apenas um minuto ativo. O YouTube alega que, para não correr riscos legais, terá de usar filtros e bloquear conteúdos potencialmente com direitos de autor de forma automática e mais do que nunca.

Cláudia Martins, advogada sénior da Macedo Vitorino & Associados, explica-nos que a grande novidade na nova diretiva cujo texto final foi fechado esta semana (será votado em abril) é obrigar que existam acordos entre as plataformas como o YouTube e os titulares de direitos de autor. “O artigo 13 vai dar poder de negociação às organizações que gerem os direitos de autor, que vão ter uma arma negocial imbatível, já que plataformas como o YouTube vão querer o máximo de acordos para bloquear o mínimo de conteúdos possível”, explica a advogada.

“Terão, por isso, de ser criados “mecanismos de rastreio”, que permitam assegurar que a partilha de conteúdos (protegidos por direitos de autor) se encontra licenciada e que os direitos dos autores estão tutelados”, diz Cláudia Martins sobre os chamados filtros de upload, que embora não sejam impostos na nova diretiva deverão ser ferramentas de inteligência artificial importantes para não se correrem riscos legais. Na verdade, o YouTube já tem um sistema automático, chamado Content ID, que deteta se um conteúdo colocado na plataforma usa, por exemplo, músicas de autores conhecidos (já registados na plataforma). Se isso acontecer, há já receitas de publicidade que vão para os artistas quando se usa o seu conteúdo, embora existam artistas que não aceitam sequer o seu uso.

O YouTube explica que o ano passado pagou 800 milhões de euros a detentores de conteúdos europeus e, foram pagos à indústria da música a nível global 1,5 mil milhões de euros de receitas geradas pela publicidade. “O Content ID pode até ser adequado para aplicar o artigo 13, mas aquilo que é deixado hoje ao critério das plataformas passa agora a ser regulado”, explica-nos Sofia Colares Alves, Chefe de Representação da Comissão Europeia em Portugal. A diferença, por isso, está na necessidade de negociação prévia já que a responsabilidade é agora das plataformas. “Terão de negociar verdadeiros acordos de licenciamento, não para impedir o uso de conteúdos com direitos de autor, “mas antes para permitir o uso de obras protegidas”.

As paródias (inclusive os famosos memes) são uma exceção ao artigo 13, já que se pode usar conteúdos com direitos de autor mesmo sem a tal licença, mas Sofia Colares Alves reconhece que é possível que existam conteúdos desses bloqueados automaticamente e serão necessários mecanismos para que possam ser repostos. Os youtubers contrapõem indicando que será fácil verem conteúdos humorísticos bloqueados e o desbloqueio será sempre lento de mais.

É provável que só em 2020 se comece a sentir o impacto da nova diretiva. Certo só mesmo que, durante o tempo que demorou a ler este artigo, foram carregados 1600 horas  de conteúdos no YouTube.

(na fotogaleria em cima pode ver os youtubers mais bem pagos em 2018, de acordo com a Forbes)

Leia também | O que diz o líder europeu da Google sobre o polémico Artigo 13

ALGUNS NÚMEROS DO YOUTUBE

  • Mais de 400 horas de vídeos são descarregados para o YouTube a cada minuto.
  • Mais de 1,9 mil milhão de utilizadores ativos mensalmente – quase um terço da internet.
  • Todos os dias são vistos mais de mil milhões de horas de vídeo e muitas milhões de visualizações
  • Mais de 70% do tempo de visualização do YouTube provém de dispositivos móveis.
  • O YouTube lançou versões locais em mais de 91 países E É possível navegar no YouTube num total de 80 idiomas (o que abrange 95% do universo de utilizadores da Internet).
  • Nos últimos cinco anos, o YouTube pagou mais de 2 mil milhões de dólares aos parceiros que optaram por rentabilizar as suas reivindicações através do Content ID.
  • Mais de 9000 parceiros utilizam o Content ID, incluindo as principais emissoras de TV, estúdios cinematográficos e editoras discográficas.
  • Os parceiros do YouTube reivindicaram mais de 800 milhões de vídeos desde que o Content ID foi implementado.

YouTube tem mais de 100 filmes à borla. Só precisa de VPN

EXEMPLOS DE YOUTUBERS

Mathgurl, canal para explicar matemática
É um exemplo em como o número de seguidores não é tudo no YouTube. Inês Guimarães, a youtuber Mathgurl, tem uma boa base de fãs e faz vídeos sobre matemática que já foram vistos 2,5 milhões de vezes e tem 68 mil subscritores. Partilha com outros a sua paixão pela matemática e, aos 20 anos, já lançou um livro sobre o tema.

MKBHD, o canal que mais influencia
Não é o youtuber com mais subscritores (esse é PewDiePie, com 85 milhões), mas é o mais influente criador de vídeos, do ponto de vista de fazer críticas que podem mudar produtos – as suas reviews de tecnologia fazem eco junto das grandes tecnológicas. Aos 25 anos, Marques Brownlee consegue ainda entrevistas exclusivas aos líderes da Apple ou a Elon Musk. Tem 7,9 milhões de subscritores.

SirKazzio, o rei nacional das subscrições
Aos 26 anos, Anthony Sousa, ou SirKazzio, é o youtuber português com mais subscritores, que seguem a sua vida e canções. No total são 5,1 milhões de seguidores. No entanto, o youtuber Wuant embora tenha menos, um total de 3,3 milhões, consegue bem mais visualizações médias nos seus últimos vídeos (tem vários acima do milhão de visualizações)

Leia também | Youtubers e políticos portugueses em campanha contra o Artigo 13