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Aos 37 anos e depois de uma década como motion designer freelancer e autodidata, Filipe Carvalho tornou-se no primeiro português a vencer o desejado Emmy pelo seu trabalho no genérico da série Counterpart.

Nasceu no Cartaxo em 1981, mas cresceu nas Caldas da Rainha e tornou-se num profissional respeitado a nível mundial na zona de Lisboa. Filipe Carvalho dedicou-se de corpo e alma ao motion design, mas foi com os genéricos que percebeu o seu principal talento: contar histórias ao criar todo o conceito para genéricos e afins.

O mês passado foi distinguido na 70.ª edição dos Emmy Awards, em Los Angeles, pelo trabalho no genérico da série norte-americana, Counterpart, com J.K. Simmons, onde foi responsável por todo o conceito. O seu trabalho é feito no seu escritório Carnaxide, nas instalações da produtora Até ao Fim do Mundo, onde começou nesta área e com a qual continua a colaborar.

A maioria dos projetos que tem feito é com produtoras norte-americanas e colaborou com séries televisivas como The Killing, Cosmos, ou filmes como The Architect ou os da Marvel Dr Strange e Homem Aranha. Fez também trabalho para um dos vídeos de bastidores da série Guerra dos Tronos. Um dos seus maiores orgulhos foi precisamente na série premiada Cosmos, onde foi lead concept designer, ou seja, criou e imaginou o genérico da série documental que estreou um pouco por todo o mundo, trabalho para o qual também esteve nomeado para um Emmy.

Tudo começou com alguns trabalhos reunidos num portfólio em 2009, onde estavam projetos fictícios. Enviou para algumas produtoras norte-americanas e passados alguns dias teve a primeira resposta. Gostaram e queriam que colaborasse com eles e poucos dias depois tinha um trabalho para a Microsoft global. “Fiz logo parte de uma equipa de 20 freelancers, o que foi chocante para quem nunca tinha feito nada do género e depois comecei e até hoje nunca mais parou”.

Já a trabalhar com produtoras de Nova Iorque, em 2010 quis dar o salto para Los Angeles, onde há maior concorrência e é mais difícil de entrar. “Tinha de conseguir, por isso criei e executei um genérico fictício completo de um filme para mostrar o que valia”. Imaginou uma história para um filme fictício e incluiu os seus atores e profissionais preferidos de Hollywood, filmou, criou o genérico e só não fez a música.

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Enviou o resultado final por e-mail para três estúdios de Los Angeles importantes. Teve boas respostas de todos ao resultado. “Uma das respostas foi da produtora do editor do realizador David Fincher, que gostou e até brincou com o facto de ser impossível juntar todo aquele talento no mesmo filme por questões de orçamento”. Começou a trabalhar com essa produtora e, passado pouco tempo, já trabalhava com outros estúdios de Los Angeles. Neste momento colabora com 15 estúdios diferentes.

Hoje colabora com várias produtoras de topo nos Estados Unidos e dá-se ao luxo de escolher os projetos em que se quer envolver e ter de contratar alguma ajuda. Isto sempre à distância, ao ponto de ter ido a Los Angeles (onde está a produtora que lhe valeu um Emmy) pela primeira vez já este ano para receber o Emmy. “Antes só tinha ido uma vez aos Estados Unidos, há largos anos, em férias, a Nova Iorque”.

As reuniões são feitas todas por videoconferência e está sempre a trocar e-mails com os vários membros das equipas (alguns deles espalhados por vários pontos dos EUA). É o processo que conhece há 10 anos e está habituado, mesmo que chegue a casa e, depois do jantar, tenha reuniões com frequência devido à diferença horária – “às vezes tenho chamadas Skype à meia noite ou uma da manhã”. “Eu estar em Lisboa ou Nova Iorque, para eles é indiferente”, explica Filipe Carvalho, acrescentando que a maioria do trabalho é sozinho no escritório e depois vai fazendo atualizações sobre em que ponto é que está com a equipa. “Para mim funciona bem porque estou mais focado a trabalhar sozinho e a reunir-me pontualmente”.

Na série Counterpart, o seu trabalho em particular ocupou-lhe cerca de duas semanas, embora o projeto do genérico tenha demorado quatro meses (costuma ser menos) a ser concluído, tudo porque puderam acompanhar os primeiros tempos de gravação da série. No caso do genérico que valeu o Emmy, tem um misto de várias execuções: imagens reais filmadas, 3D e design gráfico. “Tudo isso funciona para um final especifico para falar de uma forma conceptual e abstrata do tema da série, foi por isso que teve o sucesso que teve. Ajudou termos acesso total ao que compõe a série, desde os guiões, aos atores e aos cenários”. Ou seja, conseguiram mais informação da série o que é habitual, o que permitiu criar melhor o conceito.

E como é que tudo começa? Filipe explica. “Eu entro nos projetos logo no início. Reúno com a diretora criativa e criamos balizas para boas soluções para o genérico. Depois leio a pesquisa que fornecem, estou alguns dias a fazer pequenos testes para mim, depois filtro a informação e defino dois conceitos de genérico. Trabalhamos depois os conceitos em conjunto e faço uma sequência de fotogramas do que é pretendido (algo parecido com storyboards, mas menos pormenorizado).” O que se segue é um trabalho colaborativo, de como será filmado, que tipo de música irá ter e que tipo de 3D terá. “Após apresentarmos ao cliente, posso ajudar no desenvolvimento da ideia escolhida ou saio do projeto e ele é executado até ao final”.

A nível técnico não tirou nenhum curso em especifico. “Tudo o que aprendi foi sozinho, apoiando-me muito na internet e nos tutoriais. Sou da geração em que a internet apareceu e pude acompanhar esta facilidade de acesso à informação”, indica. No entanto, o seu talento não é tão focado no software mas sim na criatividade e criar conceitos. Usa Photoshop e Illustrator no dia a dia e é onde desenvolve os conceitos, a que alia também com outra paixão, a fotografia. Acaba por fazer vários fotos que, depois, inclui em vários conceitos para genéricos. Só pontualmente usa programas de 3D como o 3ds Max ou o Cinema 4D. “Não sou de todo a pessoa que mexe no 3D, normalmente peço ajuda”.

No caso do genérico de Counterpart, a produtora de motion graphics norte-americana além ter usado After Effects, também usou programas como Photoshop, Illustrator e Cinema 4D. “Foi tão simples quanto isto”.