Suspensão de negócios por parte da Google pode levar Huawei a “cair a pique” nas vendas. Outros empresas, como a Samsung e a portuguesa Aptoide, podem ser as grandes beneficiadas.
As próximas semanas vão ser cruciais para se saber qual o verdadeiro impacto da suspensão da Google relativamente à Huawei. Se for de longa duração, então a influência nas vendas de smartphones no mercado português deverá fazer-se sentir só durante o período de Natal.
“No mercado português o impacto é o mesmo que noutros mercados europeus: se os operadores começarem a retrair-se em vender os telefones da Huawei e os consumidores retrairem-se em comprar os telefones do fabricante e optarem por outras marcas. Isto é a consequência que poderá ser a mais imediata, não nas próximas semanas ou meses, mas a campanha de Natal poderá ser fortemente afetada e a Huawei sofrer fortemente se não ultrapassar esta questão com o governo americano”, diz Francisco Jerónimo, analista principal da consultora IDC, uma das mais relevantes no mercado de smartphones a nível global.
Por um lado, os smartphones que já estão nas mãos dos consumidores ou em stock nos retalhistas não são afetados pela decisão. Por outro, como é a época de Natal é uma na qual muitas pessoas fazem o seu investimento num novo smartphone, é quando vão pensar melhor no impacto que esta crise pode representar para eles enquanto consumidores.
“Nessa altura quem está a pensar em comprar um telefone da Huawei, já vai saber claramente se esta questão foi ultrapassada ou não. Nas próximas semanas e nos próximos dois, três meses, não prevejo grande impacto. A partir daí é que vamos perceber o que vai acontecer e nessa altura é que se vai saber se realmente vai haver impacto”, sublinha o analista.
“O que vai acontecer vai ser muito simples: a Huawei vai cair a pique a nível de quota de mercado e de vendas, porque se não tiver o apoio dos operadores e dos retalhistas, e embora os operadores e retalhistas eventualmente até queiram apoiar o fabricante, neste momento estão de mãos atadas, porque lançar telefones sem os serviços da Google, sem atualizações de software e do sistema operativo, nenhum operador e retalhista vai arriscar fazê-lo”, considera ainda Francisco Jerónimo.
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Este clima de crise entre a Google e a Huawei vai, segundo o analista, beneficiar os concorrentes mais diretos de ambas as empresas: no caso da gigante chinesa a maior beneficiária poderá ser a Samsung, enquanto na área dos conteúdos poderão ser outras plataformas de distribuição.
Como a Insider avançou em primeira mão, a loja de aplicações da empresa portuguesa Aptoide é uma opção para a Huawei e as negociações já arrancaram.
“Nós vemos esta notícia como uma oportunidade interessante de mercado de podermos criar uma parceria com a Huawei para resolver este problema que lhes surgiu”, disse Paulo Trezentos, diretor executivo da Aptoide, em entrevista à Insider. “Não trabalhamos ainda com a Huawei, mas o escritório da Aptoide de Shenzhen [China] tem alguns contactos e que no âmbito desta notícia nós reavivamos”.
Google também perde
Como a Huawei é a segunda maior vendedora de smartphones a nível global – e a marca líder em Portugal -, o facto de alguns serviços Google, como o Gmail, YouTube e Maps não estarem instalados de origem nos smartphones da Huawei, acaba por ser um ponto negativo também para a gigante norte-americana, pois perde uma grande base de utilizadores. Só em 2018, a Huawei vendeu mais de 200 milhões de smartphones a nível global.
Se juntarmos as vendas de todas as marcas chinesas a nível global, então aí o peso é de 43%, quase metade da quota de mercado do universo Android. “Isto pode levar a que a Google seja das empresas que mais perde, se realmente um terceiro sistema operativo e alternativa viável ao Android crescer e aparecer. E não tem necessariamente de aparecer na China. Pode aparecer na Europa, por exemplo, controlada por empresas chinesas”, disse ainda Francisco Jerónimo.
O grande poder que a Google tem, pelo sistema operativo Android e pela integração dos seus serviços de origem, “distorce a competição e necessariamente também a inovação”, considera Paulo Trezentos. “Nós sempre levantamos esta questão. Agora a Huawei está a sentir o reflexo desse poder, esse poder discricionário que a Google tem”.
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“Nós sentimos que estes eventos poderão despoletar uma mudança do ecossistema Android em que há uma maior concorrência, nomeadamente a possibilidade de uma Huawei, uma Amazon, uma Tencent poderem, em conjunto connosco ou com outros, desenvolver um sistema operativo Android mais aberto, em que cada membro do ecossistema possa contribuir com os seus serviços e não tenham necessariamente que ser só os serviços do Google a estarem lá”, disse ainda Paulo Trezentos.
Mas Francisco Jerónimo, da IDC, está convencido que, neste caso específico, o software vai levar vantagem sobre o hardware.
“Pedir às pessoas para que aprendam a trabalhar com outras aplicações alternativas ao Google Maps ou ao YouTube, é algo que vai ser muito complicado. Os consumidores vão mais facilmente decidir ‘ok não compro Huawei, compro outra marca qualquer que me ofereça tudo isso já pré-instalado‘”.