Paula Panarra: “Inteligência artificial vai ser crucial para a economia portuguesa”

Paula Panarra Microsoft
Paula Panarra lidera a Microsoft Portugal desde 2016

Para a maior parte das empresas portuguesas, a inteligência artificial já é uma prioridade nas suas estratégias digitais. Falámos com a diretora-geral da Microsoft Portugal, Paula Panarra, sobre o uso, impacto e desafios da inteligência artificial nas organizações portuguesas.

 


Insider: O estudo começa com presidente da Microsoft, Brad Smith, a referir-se a Portugal. Diz que os desenvolvimentos em inteligência artificial vão ser cruciais para o sucesso do país daqui para a frente. Quão crucial acredita que vai ser?

Paula Panarra: Acho que ele tem razão, que vai ser de facto crucial para a economia portuguesa, acima de tudo pela competitividade que a economia portuguesa tem que ganhar num mundo que é um mundo de negócios cada vez mais global.

A inteligência artificial, na verdade, o que nós acreditamos que vai permitir trazer aos vários negócios, é por um lado diferenciação e por outro eficácia ou eficiência. Em qualquer uma destas três será relevante para aquilo que são os negócios tradicionais em Portugal se tornarem mais competitivos numa economia mais global.

Se pensarmos na indústria, por exemplo, que é um dos sectores base da nossa economia, tudo aquilo que estas tecnologias vêm permitir, quer do ponto de vista de otimização das operações em gestão de fábrica, quer do ponto de vista de diferenciação de produto final.

Imaginemos, por exemplo, uma empresa que hoje produz bens e que amanhã pode entregar esse bem, mais um serviço com os dados da sensorização desse bem e da utilização desse bem. São camadas de diferenciação que acreditamos que são aquilo que vai fazer a diferença nos negócios.

Se pensarmos em sectores como a agricultura, que é um sector primário, mas tão relevante, nomeadamente a vinha, os novos produtos muito tradicionais, mas que estão a ganhar até um valor muito premium nos mercados internacionais, aquilo que este tipo de tecnologias pode trazer do ponto de vista de desenvolvimento de culturas naturais, do ponto de vista de otimização das produções, do ponto de vista até de colocação dessas produções, são dois exemplos em dois sectores diferentes, mas ambos sectores base da economia portuguesa.

Estas tecnologias podem de facto vir a criar uma camada de diferenciação importante.

Esta ideia é referida várias vezes ao longo do estudo: prevê-se que o impacto da inteligência artificial em diferentes sectores seja enorme. Por outro lado significa que se não evoluirmos de forma rápida, pode deixar-nos muito para trás em comparação com outros.

Foi o nosso objetivo ao fazer este estudo, se quiser, pintar o diagnóstico ao dia de hoje da sensibilização e da adoção – aquilo a que se costumam chamar índices de maturidade – para estas tecnologias em Portugal, foi também trazermos essa sensibilização para o mercado e fazer saber onde é que estamos, se já é ou não uma preocupação, se já é um interesse, se já há real adoção.

Porque é uma inevitabilidade, é uma boa inevitabilidade do ponto de vista da camada de inteligência que pode trazer às operações, aos processos e aos negócios. Quanto mais o mercado português se preparar e adotar estas tecnologias, nós acreditamos que melhor vai ser para a nossa economia.

O estudo diz que as nossas empresas são pouco maduras em inteligência artificial, mas que têm grandes expectativas relativamente a esta tecnologia. Estas conclusões surpreenderam-na de alguma forma?

Honestamente não. Acho que temos tipicamente uma apetência grande e um interesse grande por aquilo que são novas tendências, é isso que vemos no geral nas empresas e até na cultura portuguesa. Somos early adopters de muita coisa.

O haver um interesse e já uma expectativa grande daquilo que o impacto pode vir a ser não me surpreende. Pela experiência que temos tido nos últimos meses, também sabemos que ainda não há uma maturidade muito grande, há muitas empresas que ainda estão a fazer os primeiros pilotos, a testar os primeiros conceitos, a testar os primeiros casos, e ainda há relativamente poucas empresas que já têm de facto esse tipo de tecnologia embebida em processos produtivos ou em processo contínuo.

O que não é totalmente verdade, porque nós todos e todos os nossos clientes que utilizem Outlook, por exemplo, na nossa plataforma de Office 365, hoje já têm uma separação do email entre o destaque e os outros, e isso não é mais do que uma pequena ferramenta de inteligência artificial que está todos os dias a ajudar-nos a gerir melhor aquilo que são as nossas ferramentas de produtividade.

Uma utilização consciente sim, na verdade a inteligência artificial do ponto de vista de tecnologia já está embebida hoje em muitas das tecnologias base que muitas das empresas já estão a usar.

Mas acaba por haver uma grande discrepância. Em 2017, a Associação de Comércio Eletrónico (ACEPI) dizia que 60% das empresas portuguesas não tinham sequer uma presença online. Agora estamos a falar de empresas portuguesas que apostam em inteligência artificial. Parece haver aqui uma discrepância grande. Preocupa-a de alguma forma saber que há empresas que não estão de todo consciencializadas para a importância do digital?

Esse é um bocadinho o nosso trabalho. O nosso e o vosso, acho que há um papel dos meios de comunicação naquilo que é o informar e o trabalhar das empresas em Portugal.

Sem dúvida que a transformação digital das empresas é uma jornada, não é um projeto e não acontece hoje. São projetos que normalmente acontecem a dois, três, quatro anos dentro das empresas.

O que nós vemos é que há um número muito grande de empresas que já começou esse pensamento. Há algumas que já começaram essa execução. Há poucas que já vão tão longe na execução que até já usam tecnologias de inteligência artificial, mas ainda há muitas que não começaram sequer esse percurso.

Penso que o país está num momento, do ponto de vista económico, que permite mesmo às pequenas e médias empresas começarem a olhar para alguns fundos que existem disponíveis do 2020 e que podem dar suporte às empresas para iniciarem o seu processo de digitalização, porque esse é um primeiro passo para depois ser possível, tendo uma presença na internet, por exemplo, ter um chat bot para fazer um serviço ainda melhor daquilo que é a sua presença na internet.

A forma como nós vemos a introdução da inteligência artificial na transformação digital das empresas é isso mesmo, é uma camada adicional de tecnologia e de inteligência em cima dos dados que as empresas têm, que vai permitir e não passe mais além. Mas o caminho tem que começar por digitalizar, por olhar para os processos, por olhar para os empregados, por olhar para o modelo de negócio, desenhar e traçar essa estratégia de transformação digital.

Especificamente, como é que a Microsoft Portugal tem tentado trazer mais empresas para a inteligência artificial?

Temos feito, por um lado, uma preparação daquilo que é o nosso ecossistema de parceiros e nós temos cerca de 3.000 empresas em Portugal que, de alguma forma, são parceiros em tecnologia Microsoft.

Portanto, preparar o nosso ecossistema é sempre a nossa primeira preocupação para assegurarmos que todos aqueles que estão a fazer desenvolvimento de software em Portugal estão já expostos ao potencial que estas novas tecnologias podem trazer.

Depois temos feito trabalho diretamente com os nossos clientes no sentido de os ajudarmos a fazer um bocadinho este pensamento da jornada de transformação e posicionar aquilo que são estas novas funções, naquilo que são as áreas em que os clientes estão mais focados.

Até à data, o que temos visto é acima de tudo uma preocupação com otimizar operações, ganhos de eficiência com a utilização deste tipo de tecnologias, e por outro lado melhorar aquilo que é o atendimento ao cliente, ou a experiência com o cliente.

Porque estas tecnologias podem trazer também em simultâneo uma eficiência, porque se pode reduzir o número de contactos com o humano, mas por outro uma eficácia e um serviço muito melhor – posso ter um humano a dar-me sugestões, por exemplo, muitos mais próximas daquilo que é o meu interesse, do que uma sugestão genérica. Estas são as duas grandes áreas onde os clientes nos têm pedido para ajudarmos a trazer estas tecnologias.

No passado, uma barreira que existia na adoção de novas tecnologias era o custo. Mas como a inteligência artificial já vem integrada noutros produtos, desta vez não há tanto a ‘desculpa’ de não ter dinheiro para investir.

Nós temos até várias pessoas que fazem investigação em inteligência artificial em Portugal, é uma coisa das décadas e do século passado. O que hoje é possível é a capacidade de computação que toda a indústria da tecnologia veio trazer, não foi só a Microsoft, mas outros grandes players. Ao fazermos grandes investimentos em data centers centrais, viemos criar as condições para que essas tecnologias possam ser usadas como um serviço, portanto subscrevo um serviço e uso como usámos a subscrição das telecomunicações ou da TV cabo lá de casa ou de algum aluguer que tenhamos.

Posso fazer esse tipo de utilização da tecnologia, versus fazer uma aquisição que era o que acontecia no passado. Por isso é que essas tecnologias só eram permitidas a alguns, que tivessem grandes capacidades de investimento. Hoje em dia estas tecnologias são pedaços de serviços que o que eu faço é subscrever, pagar quando quero usar e deixo de pagar quando não quero usar.

É esta democratização da tecnologia que na verdade a indústria hoje está a permitir e que faz com que a democratização de adoção destas tecnologias também seja possível. É a tecnologia dos grandes, acessível aos pequenos.

Um dado interessante no estudo é que metade das empresas diz que a inteligência artificial vai ter impacto em áreas que não são sequer conhecidas. Como é que se trabalha e prepara um futuro que não se conhece?

O existir essa consciência é espetacular, porque isso só significa que já fizemos imenso trabalho do ponto de vista de criar nas empresas portuguesas esse despertar para novas formas de fazer negócio e que estão tipicamente associadas a modelos digitais. O que todos temos visto é o surgir de uma série de plataformas de partilha, novos modelos de negócio até em sectores tão tradicionais como a banca ou a seguradora.

Há um despertar muito maior de todas as empresas para ‘eu vou ter que criar novas fontes de receita’. Aquilo que está a ser mais frequente é as empresas encontrarem forma de prestar um serviço em cima do seu serviço base. Se quisermos um edifício inteligente, em vez de construir o edifício, ele já ser inteligente, entrego no fim e vou-me embora, continuo a prestar o serviço da manutenção do edifício, fazendo para isso uso dos dados e da inteligência da sensorização desse edifício.

Há de facto já uma sensibilidade maior das empresas para ‘eu vou tirar ainda mais partido das tecnologias nestes novos pedaços de negócio que vou ter que criar‘. Ainda não se sabe bem como e para isso é preciso criar organizações um bocadinho diferentes.

Culturalmente, estamos preparados para isso?

Acho que sim, é uma preocupação que vem do CEO ou da administração, as empresas começam a estar preparadas. Quando é apenas ainda uma conversa de dois ou três curiosos dentro da empresa, a dificuldade de fazer acontecer é muito maior. Penso que os gestores portugueses estão mais conscientes, até pela inclusão das novas gerações de profissionais.

Quem hoje está a entrar no mercado de trabalho é cada vez mais próximo de um nativo digital, a inclusão desse novo conhecimento e desse novo talento tem estado a despertar as empresas também, porque essas pessoas trazem mais curiosidade, novas formas de abordar o negócio, mas é preciso fazer alguma mudança cultural dentro das empresas.

É preciso aceitar arriscar, é preciso aceitar errar, é preciso aceitar que gente mais nova sabe mais do que o saber de anos feito, pelo menos naquilo que é o despertar de novas ideias e de novos conceitos, é preciso saber quebrar silos e trabalhar mais em modelos ágeis e modelos mais multifuncionais. São competências que as empresas portuguesas vão ter que adquirir ou desenvolver aquelas que já têm algum embrião disso.

Outro número do estudo é que o número de negócios e investimentos em inteligência artificial feitos em Portugal nos últimos oito anos estava muito atrás da restante realidade europeia. Despertámos tarde de mais para isto ou aquilo que estamos a desenvolver é muito focado no nosso mercado e não é tão apelativo para mercados externos?

Penso que será talvez um misto dos dois. Tivemos as empresas portuguesas, nos últimos oito anos, a fazer num primeiro momento ainda alguma contenção, num segundo momento um investimento de aceleração naquilo que foi a modernização. Acho que agora estamos no ponto, do ponto de vista de capacidade de investimento e crescimento de negócio, para continuar esse desenvolvimento e adotar esse tipo de tecnologias.

Não deixa de ser curioso, no entanto, que temos algumas empresas em Portugal que já fazem da inteligência artificial o seu core. Todos nos orgulhamos do trabalho que uma Feedzai, por exemplo, tem vindo a fazer pelo mundo. Aquilo que eles fazem é acima de tudo democratizar a inteligência artificial em cima de deteção de fraude.

Estou convencida que mais vamos ver. Criámos uma boa fundação para termos empresas de tecnologia a desenvolverem-se em Portugal. Essas são as primeiras a acelerar nesse tipo de tecnologia que depois, de alguma forma, vão ser soluções que outras vão poder utilizar.

Temos em Portugal uma joint-venture com a BMW para desenvolver inteligência artificial para a indústria automóvel, temos na Bosch uma série de investigação, mas que está em Portugal e que são os investigadores portugueses a desenvolver também em cima dessas tecnologias. Eu acho que estamos no ponto se calhar para acelerar algumas dessas tecnologias.

Acredita que Portugal vai agora dar o salto na inteligência artificial?

Acredito que nós temos condições, até porque temos tido uma consolidação do ponto de vista de formação em engenharia muito interessante no nosso país, que é na verdade o que tem permitido trazer este tecido de talento que faz com que se tenham captado tantas empresas internacionais a virem trabalhar em Portugal.

Acho que se a academia também fizer esse passo adicional de acompanhar, vamos ter condições para desenvolver em Portugal ideias muito interessantes e aplicações muito interessantes deste tipo de tecnologia.

Há pouco falou desta questão: a inteligência artificial para funcionar bem, precisa de dados. Um dos pontos referidos no estudo é a ausência de dados em sectores, sobretudo os mais tradicionais. Que radiografia faz a este cenário em Portugal?

Não é possível haver uma boa aplicação de inteligência artificial se não houver uma boa camada de dados e uma boa capacidade de computação. São duas variáveis necessárias para poder fazer funcionar a terceira. Mas esse foi talvez um dos saltos mais importantes que foi dado ao nível da indústria da tecnologia, a capacidade de tratar dados estruturados e não estruturados.

Acho que as empresas ainda têm muito o receio de não terem os dados suficientemente estruturados, arquiteturados e desenhados para dar resposta, quando a tecnologia hoje já não precisa tanto disso.

Precisa de dados: podem ser estruturados, não estruturados, próprios, públicos e o que a tecnologia faz é isso mesmo, mastigá-los todos em cima de algoritmos que obviamente dependem do negócio e que precisam desse pensamento, para depois dar as respostas adequadas com essas novas tecnologias.

Sim, há uma lacuna de dados, mas se calhar há mais dados do que as pessoas possam pensar, porque de facto já é possível conjugá-los de formas que no passado não era possível.

Mas é fácil recuperar essa desvantagem? Se eu for um agricultor que ainda não tem fontes de dados, mas agora quero começar a investir. Ainda dá para recuperar ou já estou muito atrás?

Há sempre um primeiro momento. Como digo, acho que, e nós temos visto isso, há soluções que funcionam como biblioteca de dados de outros que na verdade são aplicáveis a mim.

Há algumas soluções que permitem fazer a utilização de dados anonimizados e utilizados para criar algoritmos. Depois tenho que ensinar com os meus dados e isso demora algum tempo, mas não começo do zero. As soluções hoje em dia já permitem estas situações mistas, de começar a sensorizar agora para aquilo que é a minha produção, o meu negócio.

Mas o que vou fazer para acelerar a aprendizagem é utilizar biblioteca de dados que já existem de situações similares.

No relatório, e achei curioso, falava-se na importância das empresas criarem manifestos de inteligência artificial. Concorda com esta visão? As empresas precisam mesmo de ser muito transparentes sobre os trabalhos que fazem nesta área?

Penso que pelo menos nós, Microsoft, temos uma preocupação ética grande relativamente àquilo que é o desenvolvimento de tecnologias que utilizam inteligência artificial e, portanto, acreditamos que essa evolução tecnológica vai precisar de algumas regras de ética, conduta, transparência e privacidade que cabe à indústria assegurar.

Isso precisa de alguns manifestos de intenções, vamos pôr assim, para garantir que o desenho tecnológico é feito de acordo com esses princípios. Nós fazemo-lo, a Microsoft tem inclusive um conselho de ética corporativo onde qualquer pedaço de nova tecnologia desenvolvida que utilize este tipo de tecnologia de inteligência artificial é considerado e aprovado em conselho de ética, porque acreditamos que ela tem que ser transparente, justa, segura e ética.

Assegurar que não há diferenciação ou que a tecnologia não gera diferenciação quando são usados, por exemplo, reconhecimento facial ou reconhecimento de voz, assegurar que não existe discriminação.

Assegurar que quando interajo com uma máquina, sei que estou a interagir com uma máquina e não me é percepcionado que é um ser humano quando não é. Uma série de pequenas grandes coisas que fazem na verdade as fronteiras da utilização da inteligência artificial enquanto elemento que aumenta o homem e não que pode, de alguma forma, vir a ser utilizado em detrimento do bem da humanidade.

Tivemos o exemplo recente do Facebook: tecnologias com um potencial enorme, não se consegue prever todos os cenários de utilização negativa. Há quem acredite que na inteligência artificial o cenário pode ser exponenciado. As empresas mostram preocupação relativamente a isto? Não querem usar já, porque ainda não sabem como pode ser usada para utilizações maliciosas?

Penso que os primeiros a terem que assegurar essas preocupações são quem a desenvolve e por isso é que nós Microsoft temos, até de alguma forma, liderado alguns destes movimentos dentro da indústria da tecnologia. Somos nós que depois vamos pôr nas mãos de outros pedaços de tecnologia para serem incorporados e utilizados.

As empresas têm alguma preocupação, mas penso que também, pelo menos é o que eu vejo, cada vez mais confiam em nós, indústria de tecnologia, para assegurar que o desenho e a concepção é feita com esses princípios.

Jamais a humanidade vai conseguir assegurar que o que quer que seja é usado sempre com os fins adequados. Isso aconteceu ao longo da história da humanidade com tudo e vai continuar a acontecer, porque é isso que caracteriza o facto de nós sermos seres humanos.

Mas naquilo que é a concepção e a criação, para nós é um momento em que é importante desenhá-lo com esses princípios de ética e depois esperar que a quem o disponibilizamos, o faça para os fins corretos.

Outra conclusão do estudo relativamente a Portugal é que a inteligência artificial é importante para os gestores de topo, mas não é tanto junto dos seus funcionários. Não era importante que, nesta fase, os trabalhadores já estivessem mais consciencializados do que isto vai fazer mexer, ainda para mais sabendo que em algumas áreas pode representar despedimentos?

Penso que nós vamos assistir ao longo dos próximos anos a um expandir dessa preocupação para toda a organização. Até porque, as organizações que começarem a fazer a adoção dessas tecnologias e a inclui-la nos seus processos produtivos, vão ter que formar as pessoas, vão ter que assegurar que a organização está preparada.

Acho que é por isso que ainda é uma preocupação de quem tem que definir a visão e o caminho que as empresas vão seguir, e não tanto de quem está a operacionalizar o negócio que se faz hoje. Acho que vamos assistir a um movimento em que a preocupação vai passar a ser de todos.

Há que haver formação e a formação na vida adulta é provavelmente uma realidade nova para todos, não se esgota quando se termina a universidade e se começa a trabalhar. Há uma necessidade de reinvenção e de formação contínua que as empresas vão ter que repensar nos seus modelos de formação aos seus empregados.

Mas tem que haver se calhar uma maior curiosidade de cada um de nós de aprender, porque há tantas ferramentas disponíveis hoje em dia de aprendizagem gratuita, de muitos níveis de profundidade, que é um bocadinho também a mentalidade de todos que vai ter que mudar ao longo dos próximos anos.

Há um número do estudo que diz que 18% das empresas portuguesas não pensam sequer em inteligência artificial? Surpreende-a este número de alguma forma?

Não. Se ainda há 60% das PME que não têm sequer uma página web, uma presença digital, é normal que haja ainda muitas empresas que não têm sequer isso ainda no seu radar.

Nós ainda temos empresas na ‘versão 0’ desta transformação, temos outras que vão na ‘versão 3’ e o nosso papel é assegurar que aceleramos quem ainda está mais atrás, que preparamos melhor quem já está mais maduro para este tipo de tecnologias, mas há um caminho a ser feito e é um caminho que vai demorar três, cinco anos.

Numa entrevista, a professora Manuela Veloso dizia que todas as empresas, não importa se fazem sapatos ou desenvolvem software, vão precisar de cientistas de dados. Vai funcionar mesmo assim?

Vai funcionar mesmo assim. Penso que o que pode não ser verdade é que todos têm que o ter dentro de casa. Do mesmo modo que eu acho que hoje em dia todas as empresas vão ter que ter um especialista de segurança, porque a nova realidade assim o pede, também vão precisar de especialistas de dados.

Podem é utilizar o serviço de outros para fazer o trabalho que precisam de consultoria de dados, criação de algoritmos, interpretação dos dados, criação dos dashboards, por aí a fora. Não acho que as empresas todas vão ter que ter um cientista de dados dentro de casa, mas todas vão ter que saber onde é que o vão buscar.