Startups portuguesas: parcerias asiáticas e criação de valor

Opinião de Paulo Trezentos, CEO e co-founder da Aptoide, uma plataforma aberta para distribuição e descoberta de aplicações móveis Android com presença global, incluindo na China.

As tecnológicas com cultura de startup que operam em Portugal têm três tipos de modelo: 1) empresas estrangeiras que criam unidades de serviços em Portugal 2) fundadores portugueses que mudam a empresa para os Estados Unidos ou UK e mantêm cá algum do desenvolvimento 3) empresas portuguesas com sede e operações em Portugal. Os três modelos criam valor ao país, sob a forma de emprego e pagamento de impostos, mas nem todos no mesmo grau.

O modelo em que a sede da Startup está no país é sempre o mais vantajoso por diferentes razões. Os impostos sobre os lucros e dividendos são pagos no próprio país. Os investidores deslocam-se para ter reuniões de administração e acabam por ficar a conhecer o ecosistema. Os fundadores da empresa acabam por partilhar a sua experiência localmente e servir de modelos (no bom, e no mau) para as gerações seguintes. Essa é a receita de Silicon Valley.

Também é o modelo mais difícil: na verdade, não há nenhum Unicórnio com sede em Portugal.

Na Aptoide já tivemos várias vezes decisões de investimento dependentes de mudarmos a sede mas sempre considerámos que é possível ter a sede em Portugal e uma ambição global. Ter a sede em Portugal não nos impediu de ter investidores alemães, chineses e de Singapura. Não nos impediu de ter 240 milhões de utilizadores da nossa loja de Apps para Android em 2018 espalhados pelo mundo.

Uma empresa global não vive sem alianças estratégicas. Muitas startups portuguesas vêem, no ecossistema americano a aliança natural. Contudo, a história recente demonstra-nos dois desfechos: ou a empresa acaba porque não é competitiva ou tem sucesso e passar a ser americana (em capital, sede e na americanização dos fundadores).

Para o modelo de criação de valor em Portugal, e mantendo a maioria do capital português, encontrámos na China um aliado fundamental e com outras características. Não só em investimento, mas nas parcerias de negócio. O escritório da Aptoide em Shenzhen (China) é responsável por parcerias com fabricantes Android que nos permitem chegar a mais de 50% dos nossos utilizadores finais. É a partir desse escritório que fazemos também parcerias com empresas chinesas de jogos. Muitos não saberão que a Supercell (Clash of Clans, Clash Royale,…) é chinesa, por exemplo.

A realidade das parcerias estratégicas de startups reside no modelo de desenvolvimento dessas duas super-potências. O modelo americano, que produziu empresas com o Google, Amazon ou Facebook, é o modelo dos fundadores estarem à distância de uma hora de carro dos investidores. O modelo chinês é um modelo descentralizado, em que as trocas negociais são proporcionadas por parcerias locais fora da China. Com isto, não se diz que é fácil ter a China como parceiro. É especialmente importante procurar resultados médio-longo prazo e sabermos adaptar-nos a uma forma de fazer negócio diferente. É curioso ver que este conhecimento está expresso na própria cultura popular portuguesa em expressões como “negócio da China” ou “paciência de chinês”.

No jantar de abertura da Web Summit falava com um fundador de uma empresa canadiana que tinha fechado uma ronda de investimento de 100 milhões de euros. Ele dizia-me que a opção de se manter em Montreal não era a que lhe trazia mais vantagens a curto prazo mas era a que criava mais valor ao seu país e às gerações que virão. Essas gerações farão novos negócios nos quais ele eventualmente participará. A transmissão de valor entre gerações é a único modelo de criação de valor de longo prazo.

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