Loading the player...

Chama-se Marija Vranic, é uma investigadora sérvia há 10 anos em Portugal e ganhou o prémio Científico IBM, graças a um projeto sobre lasers ultraintensos que podem mudar o tratamento do cancro e prevenir acidentes na aviação e na indústria.

Num português com sotaque de leste, mas facilmente percetível, Marija Vranic estava entusiasmada quando falou connosco, a poucas horas de receber das mãos do presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, o Prémio Científico IBM. A 28ª edição da distinção nacional coube à investigadora sérvia, de 34 anos, quase 10 deles passados em Portugal (pelo meio teve um período na República Checa).

Nascida em Belgrado em 1984, licenciou-se em Física Teórica na Universidade da sua cidade natal, mas só descobriu a paixão pela área dos lasers ultraintensos quando fez um estágio em Belfast. No Instituto Superior Técnico (IST), encontrou um grupo motivado e com reconhecimento internacional no Instituto de Plasmas e Fusão Nuclear, daí que tenha escolhido vir para Portugal em 2009 para fazer doutoramento na área de interação dos lasers ultra-intensos com plasmas. Entretanto, a sua tese de doutoramento foi distinguida com o prémio internacional John Dawson PhD prize, o qual reconhece os melhores doutoramentos no campo dos aceleradores baseados em tecnologias de plasmas.

Marija Vranic no laboratório de lasers do Técnico. (PAULO SPRANGER/Global Imagens)

E o que faz no Técnico? Estuda as interações de lasers ultraintensos com a matéria. “Com estes lasers ultraintensos, sobretudo da nova geração, podemos criar condições extremas, que normalmente existem só no espaço, mas podemos criá-las em laboratório”. Ou seja, ao acelerar-se partículas é possível gerar novas fontes de radiação com novas aplicações industriais ou médicas.

Esta é a teoria. As aplicações práticas deste tipo de investigação podem trazer uma revolução em alguns tratamentos e em algumas operações na indústria. “O mais fácil de explicar é a aplicação nas fontes de radiação, os raios X ou raios gama, que passam a poder fazer imagens não invasivas com contraste elevado, detalhe e qualidade de grande nível, muito melhor do que se usa hoje”, explica Marija (lê-se Maria). Esse detalhe “vai permitir ter diagnósticos com maior precisão, podem-se ver doenças mais cedo e diminuir de forma significativa a possibilidade de um diagnóstico errado”. No fim de contas, pode salvar muitas vidas.

Conheça os robôs que estão a ajudar os CTT a distribuir o seu correio

Mudar o tratamento de cancro

Marija explica ainda que, dentro de 10 anos, esta investigação pode “mudar a terapia do cancro, usando feixes de iões”. Hoje já existem terapias experimentais com aceleradores convencionais, mas com preços avultados (uma sessão pode custar 50 mil euros) e sem concretizar todo o potencial. O objetivo é que este tipo de lasers ultraintensos ajudem a matar as células malignas sem abrir o corpo e sem prejudicar as células saudáveis, ou seja, sem prejudicarem o paciente. “Hoje esta terapia experimental usa feixes de luz, mas isso faz mal nas zonas à volta do tumor e o que queremos é ter uma alta precisão para melhores resultados e um tratamento muito mais eficaz e menos invasivo, sem qualquer operação”, explica a investigadora.

Outro uso pode ser para estudar a qualidade das componentes críticas na indústria. “Por exemplo, pode-se verificar se o motor de um avião está em boas condições, sem o abrir”. O uso destes lasers eficazes pode ser feito “em qualquer industria”: “se existe uma componente e é necessário ver a qualidade de construção sem o abrir ou ser invasivo, esta tecnologia permite fazê-lo com ótimos resultados”. Daí que possa ser utilizada na indústria da segurança, do controlo de qualidade e na medicina.

Embora haja uma colaboração estreita com a indústria, é difícil de prever quando haverá produtos concretos, porque esta tecnologia “é algo completamente novo”.

O seu trabalho acaba por não ser essa passagem para a indústria, algo que o centro de investigação por onde passou na República Checa (especializado em lasers de última geração) está a fazer, com o apoio de várias empresas multinacionais. “O meu trabalho é ajudar os experimentalistas a obterem os primeiros resultados, a fazerem prova de conceito (proof of concept)”. Depois disso, quando se comprova que o conceito funciona, o próximo passo é ir para aplicações concretas.

O trabalho que levou agora à distinção acaba por ser o resumo da sua tese de doutoramento. “Desenvolvi algoritmos que permitem, de uma maneira mais eficaz, usando supercomputadores, simular estes processos de interações extremas que acontecem no laboratório hoje em dia”. E porque é isso faz a diferença? “Porque ajuda a planear as experiências e interpretar os dados que resultam delas”.

Marija espera que o prémio da IBM a ajude a obter mais apoio para a sua investigação. Sobre o tempo em Portugal, gosta do país e do trabalho no Técnico, só lamenta a burocracia e falta de dinheiro para a ciência:”O meu laboratório é muito bom, mas só o consegue por ter muito apoio dos projetos europeus. Sem isso seria difícil assegurar a continuidade da investigação”.

Universidade demite cientista que terá criado bebés geneticamente modificados