O show Mark Zuckerberg. Faz entrevistas e promete serviço de notícias

    Zuckerberg

    CEO do Facebook esteve ontem, em Berlim, para o segundo capítulo da série de entrevistas dedicadas às redes sociais. Facebook anuncia que área de notícias “de qualidade” está para breve.

    Acontece todos os anos. Mark Zuckerberg, o primeiro CEO millenial de uma empresa cotada em bolsa, coloca a si próprio desafios novos e, alguns deles, tornam-se mediáticos, ou não fosse o líder do Facebook um defensor da partilha constante de conteúdos entre seres humanos – já houve anos em que aprendeu mandarim ou aprender a por inteligência artificial a controlar a sua casa.

    No desafio para este ano, Zuckerberg propõe-se dar resposta à corrente de críticas que o Facebook tem recebido, após os vários escândalos em redor da privacidade dos seus 2,3 mil milhões de utilizadores. Para isso, o líder da rede social quer repensar as redes sociais e o polémico tema da privacidade. Durante o fim de semana, escreveu um artigo de opinião no Washington Post a pedir regulação aos vários estados onde o Facebook opera, para que dividam a responsabilidade com a rede social. Ontem, a rede social anunciou uma nova funcionalidade para permitir aos utilizadores perceberem como os seus algoritmos funcionam.

    Foi esta segunda-feira que o líder do Facebook também voltou a chamar as atenções para si próprio, tornando-se numa espécie de apresentador de talk show, ou entrevistador, num conteúdo vídeo colocado na sua página de Facebook. Depois de ter participado a 20 de fevereiro num seminário (só para si) de um professor de Harvard, Jonathan Zittrain, sobre leis, encriptação, desinformação, privacidade e diferentes modelos de negócios, agora Zuckerberg veio à Europa, a Berlim, entrevistar Mathias Döpfner, o CEO da Axel Springer, que detém vários meios europeus.  

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    This year I'm hosting a series of discussions about the future of technology and society. This time I sat down with Mathias Döpfner in Berlin. He started his career as a journalist and he's now the CEO of Axel Springer, the largest publisher in Europe. We talked about the role quality journalism plays in building informed communities and the principles Facebook should use for building a news tab to surface more high quality news, including the business model and ecosystem to support it. We also discussed the privacy-focused vision I laid out for the future of social networking and the four ideas for internet regulation I published this weekend. These are important topics and I could have spent hours talking to Mathias about them. It's important to me that we help people get trustworthy news and find solutions that help journalists around the world do their important work.

    Publicado por Mark Zuckerberg em Segunda-feira, 1 de abril de 2019

    Mural do jornalismo de qualidade

    Os desafios do jornalismo, da desinformação e das fake news foram temas abordados pelos dois responsáveis de empresas. O papel do jornalismo de qualidade em construir comunidades informadas e a forma como o Facebook pode ajudar estiveram em cima da mesa. Zuckerberg aproveitou a ocasião para anunciar que a rede social está a preparar um novo serviço de “notícias de qualidade” que será uma nova aba, onde as pessoas que busquem notícias possam encontrar informação fidedigna.

    Zuckerberg compara, depois, a nova solução com o serviço Watch, que permite concentrar os vídeos todos numa só parte do Facebook. “Será algo do género, mas para as notícias”. “Decidimos que há uma oportunidade para fazer algo semelhante ao Watch com as notícias, mas em vez de ser algo só mudança de engenheiros, eu quero recolher feedback dos peritos na área para saber os passos a dar”, explicou Mark Zuckerberg.

    Mathias Döpfner, o CEO da Axel Springer, explicou ao líder do Facebook que tudo depende do modelo que a rede social siga. “Se for para o Facebook também se transformar num produtor de conteúdos, selecionando ele próprio as notícias, aí teremos nós, os media, mais problemas com o Facebook”, explicou o responsável da empresa com mais publicações online da Europa.

    Zuckerberg contrapôs, descansando Springer, ao explicar que o Facebook não quer ser um editor, mas quer fornecer informação fiável e de qualidade. “Não vamos ter jornalistas a fazerem notícias e, claro que os conteúdos serão apropriados para cada pessoa que os vir, mas estamos numa fase inicial e a reunir opiniões”. O CEO do Facebook admite que está disponível a passar um cheque avultado para ter essa informação de qualidade, pagando aos jornais locais que forneçam conteúdos disponíveis na plataforma.

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    Licenciamento pago?

    Zuckerberg admite na conversa pagar aos editores uma espécie de taxa de licenciamento. “Isso é definitivamente algo que acho que deveríamos ter neste serviço, porque a relação entre nós e editores é diferente quando estamos a exibir o conteúdo na área em que apostamos diretamente e indicamos aos utilizadores que se trata de um conteúdo de alta qualidade e fiável”, diz o líder do Facebook.

    No entanto, Zuckerberg não fala em planos para cobrar aos clientes do Facebook pela leitura dessas notícias no site e, tudo indica, o serviço será mesmo gratuito para os utilizadores já que não é esse o modus operandi da rede social que vive da publicidade online na sua plataforma. “Estamos a olhar para as notícias de uma perspectiva muito diferente do que outras plataformas, que olham para as notícias como uma forma de maximizar as suas receitas”, disse Zuckerberg, numa clara farpa à Apple, que vai lançar um serviço pago de revistas chamado Apple News+.

    “No Mural de notícias, as pessoas estão por lá para se conectar com os seus amigos e para obter atualizações sobre o dia a dia das pessoas que conhecem. Claro que há muito conteúdo de notícias, porque é muito importante, mas há várias pessoas que até querem ter mais notícias disponíveis… Acho que deve ser o caso de 10, 15, talvez 20% das pessoas na nossa comunidade, que realmente querem ir informação de fundo (…) é isso que nos dá esperança, porque se houver capacidade de aumentar drasticamente a distribuição, podemos pagar um valor monetário significativo aos meios que participem neste ecossistema de notícias de alta qualidade. Isso é algo que me entusiasma”.

    A aproximação do Facebook ao mundo dos jornais não é recente. Já foram testadas opções, mas, excepto alguns casos em particular, a maioria dos jornais não foram pagos diretamente pelo conteúdo – a empresa pagou em géneros, recompensando-os com óculos de realidade virtual ou valores em publicidade na plataforma.

    Este vídeo acaba por ser a primeira revelação pública de uma ideia que, aparentemente, os executivos do Facebook estão a discutir há alguns meses e que era defendido pelos responsáveis que saíram da empresa o mês passado, Chris Cox e Campbell Brown. O Facebook terá mesmo já testado internamente a ideia de uma nova aba de notícias dedicada.

    Esta revelação surge também na mesma altura em que Zuckerberg está a fazer uma campanha de relações públicas e lobby na Europa e nos EUA, onde se inclui o artigo no Washington Post de que já falámos.

    (atualização, 16h, com citação de porta-voz do Facebook)

    “Como o nosso CEO mencionou esta semana num vídeo com Mathias Dopfner, também vamos experimentar um novo News Surface. Neste momento, ainda estamos a descobrir como será o aspecto, e queremos ter a certeza que estaremos a fazer isto em colaboração com a indústria, não por conta própria. No entanto, já sabemos que seremos guiados por três princípios: Princípio 1 – Este será um processo consultivo com a indústria. Queremos trabalhar com os editores para fazer isto da forma correta. Princípio 2 – Queremos divulgar informações de confiança e criar um serviço que contribua para o jornalismo de alta qualidade, que seja capaz de fazer aumentar a receita para os editores. Princípio 3 – Queremos ajudar a criar oportunidades para que os novos tipos de jornalismo prosperem, como jornalismo local e independente”. 

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