Críticas internas, decréscimo na moral dos colaboradores, adiamento na reação a questões de preconceito na rede social e jogadas políticas. Era este o cenário da crise do Facebook, com os bastidores a serem agora revelados pelo jornal norte-americano.
Não é nenhum segredo que os últimos meses têm sido complicados para a rede social de Mark Zuckerberg – e não se fala só de possíveis dores de crescimento. Nos últimos tempos, têm estado associadas à rede social questões como a influência política, falhas de privacidade, acesso indevido a dados: tudo questões que têm vindo a abalar a confiança dos utilizadores na empresa.
Depois de esta semana o NYT ter revelado que o Facebook partilharia dados dos utilizadores com fabricantes de smartphones e não estaria a garantir a devida monitorização de como era usada a informação, o jornal dá agora a conhecer as movimentações internas da rede social para reagir às crises.
Com descrições pormenorizadas, a reportagem mostra que o Facebook terá demorado mais tempo do que seria suposto a reagir aos problemas de disseminação de informações falsas, que afetam há anos a rede social. Além disso, também relata as várias críticas à exibição de anúncios políticos no Facebook. Note-se que só recentemente é que o Facebook estabeleceu regras para haver maior transparência neste tipo de anúncios.
Trocar de iOS para Android
No ‘rebentar’ do escândalo da Cambridge Analytica, Tim Cook, o CEO da Apple, teceu fortes críticas ao Facebook, por não ter protegido os dados dos seus utilizadores. Em entrevista à MSNBC, Cook disse, na altura, que “não vamos policiar a vossa vida pessoal. A privacidade é para nós um direito humano. Uma liberdade civil”.
Após estas duras críticas de Cook, Mark Zuckerberg terá pedido aos seus executivos para passarem a utilizar smartphones Android, em vez dos iPhone da Apple. Diz o NYT que Zuckerberg terá argumentado que esta troca deveria ser feita, porque o sistema operativo Android tem mais utilizadores do que o iOS (segundo dados do Statcounter, o Android tem 75% de quota de mercado). Ainda assim, apesar do relato desta exigência de Zuckerberg, não ficou explícito se a troca foi efetivamente feita ou não.
Táticas políticas na gestão de relações públicas
Em outubro de 2017, o Facebook começou a trabalhar com a consultora Definers Public Affairs, com o intuito de monitorizar a cobertura mediática da empresa. A consultora foi fundada por veteranos do partido Republicano americano, o que se traduz na aplicação de táticas políticas para a mediação de relações públicas. A questão é que esta consultora utiliza uma estratégia muito específica: algo que pode ser traduzido como pesquisa de oposição.
Entre críticas às práticas e movimentações do Facebook, fizeram-se ouvir críticas da falta de ação da empresa aos escândalos. Segundo o NYT, uma das estratégias da Definers Public Affairs para descredibilizar os críticos, passaria pela partilha de teorias de conspiração anti-semitas, que ligariam os grupos mais críticos ao multimilionário e filantropo George Soros.
Mas esta não seria a única abordagem do Facebook. O NYT refere também que Sheryl Sandberg, um dos rostos mais conhecidos do Facebook, estaria mais “interessada em proteger a sua própria marca à custa do Facebook”. E, como seria de esperar, também isto começava a gerar críticas dentro do Facebook.
Para reagir à crise de privacidade, Sandberg terá tirado partido dos seus laços com o partido Democrata, para tentar aliviar a pressão junto do Congresso norte-americano. Mark Zuckerberg foi efetivamente questionado no Congresso sobre o caso da Cambridge Analytica, tendo sido também acusado de ter adotado uma postura demasiado robótica durante a audição. Mas isto aconteceu em público: nos bastidores, Sandberg terá feito contactos e até chegado a organizar alguns eventos com presenças políticas, para conseguir navegar pelas águas agitadas do escândalo.
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