Pode servir para marcar encontros, fazer amigos ou encontrar um emprego novo. Mas o Wonderloop quer ser uma rede social diferente das outras.
Foi o primeiro fenómeno da internet em 2019. Durante semanas, o desafio dos 10 anos invadiu as redes sociais. Na plataforma que Hanna Aase lançou esta semana, o desafio é de apenas dez segundos. No Wonderloop é esse o tempo que os utilizadores têm para conquistar quem está do outro lado.
O conceito da nova rede social é simples: em vez de uma fotografia de perfil, os utilizadores criam um vídeo. “É uma versão sexy do LinkedIn. Ou um Tinder em vídeo que também serve para fazer amigos. O objetivo é facilitar oportunidades, quer as pessoas estejam à procura de um emprego ou de novos amigos. O vídeo permite perceber melhor quem as pessoas são, devido a características como a voz ou a expressão corporal. Gera confiança”, explica Hanna Aase, a norueguesa fundadora do Wonderloop, em entrevista ao Dinheiro Vivo.
Tal como no Tinder, a aplicação permite deslizar o perfil que se está a ver para a esquerda ou para a direita, consoante o interesse que despertou. É ainda possível procurar utilizadores nas proximidades e enviar mensagens aos “favoritos”. Cada perfil terá acesso ao endereço URL do seu vídeo, que pode ser usado, por exemplo, na assinatura do email.
Leia também | LinkedIn. O segredo para encontrar emprego na rede social
Para Hanna, que criou o conceito de raiz, dez segundos é tempo “mais do que suficiente” para um utilizador decidir se quer saber mais sobre a pessoa que está a ver, seja ela um futuro colaborador ou encontro de sexta-feira à noite. “Ao fim de quatro segundos o nosso cérebro já tomou a decisão”, destaca.
Para já a plataforma só funciona por convite, mas é possível pedir para entrar. A médio prazo, o objetivo de Hanna é criar um motor de busca com milhões de “bilhetes de identidade em vídeo”. Uma terra de oportunidades virtual para quem, como a própria fundadora, nasceu numa terra pequena e teve de ir à luta para ser levada a sério no mundo da tecnologia.
A Oprah Winfrey das redes
“Acredito que o Wonderloop possa mudar a vida de muitas pessoas”, atira. A história de Hanna Aase começa numa pequena cidade norueguesa, na qual foi obrigada a viver sozinha a partir dos 14 anos. “Tinha a vida virada do avesso e, a certa altura, a única coisa que me dava conforto era o programa da Oprah Winfrey. Os momentos mais felizes do meu dia eram quando ela oferecia coisas às pessoas, fossem casas, carros ou bolsas de estudo. Fazia-me feliz vê-la a dar oportunidades às pessoas que elas não teriam de outra forma”.
Desde os 14 anos que Hanna pensa numa forma de “todos podermos ser a Oprah e criar oportunidades para os outros”. Com a tecnologia percebeu que era possível. Estudou empreendedorismo e deu aulas, até que decidiu dar o salto para o mundo dos unicórnios. Na Noruega, não teve sorte. “Candidatei-me a investimento público mas fui chumbada. Se o meu próprio país não acreditava em mim, para quê ficar?”. O financiamento acabou por surgir do outro lado do mundo.
Foi nos Estados Unidos que Hanna desenvolveu o Wonderloop, e percebeu porque é que a Europa não tem a sua Silicon Valley. Foi esse, aliás, o tema que a trouxe a Portugal. Hanna Aase foi uma das oradoras das conferências Horasis, que tiveram lugar em Cascais.
Leia também | MySpace. Como a primeira grande rede social não soube resistir ao tempo
“A minha opinião não é muito bem recebida. Acho que os europeus não têm o que é preciso para criar uma tecnológica. Pensam que podem ter folgas todos os fins de semana e beber o seu copo de vinho à sexta à noite, mas ninguém vai conseguir criar a próxima Microsoft se é esse o estilo de vida que quer seguir”, sublinha.
Para a norueguesa, devota de “deuses” de Silicon Valley como Jack Dorsey, fundador do Twitter, ou Mark Zuckerberg, do Facebook, é a “obsessão pelo produto”, mais do que o acesso a financiamento, que dita o sucesso de uma tecnológica.
Leia também | Excesso de trabalho, ansiedade e insónias: as maleitas do setor tech
“Sem a mentalidade certa, um fundador europeu até pode receber milhões em investimento mas nunca terá sucesso. Eu faço ioga, durmo o suficiente e alimento-me bem para conseguir ser produtiva, não é para aproveitar a vida. Não acho que toda a gente deva ser assim, as pessoas têm o direito a querer uma boa vida. Mas não pensem que vão criar o próximo unicórnio, porque não vão”.
Pelo direito à “loucura”
O projeto Wonderloop começou a ganhar forma há cinco anos, ainda o mundo não tinha despertado para o movimento #MeToo. Mais do que ter nascido numa pequena cidade norueguesa, foi o facto de ser mulher, e querer fazer parte de um universo masculino, que a fez pensar desistir algumas vezes.
“Antes desta nova onda de consciencialização, não havia alertas para as dificuldades que as mulheres passam para entrar na tecnologia. Hoje sou das poucas mulheres do mundo que pode dizer que fundou uma rede social, que é especialista em tecnologia para consumo. Mas é difícil mudar a perceção das pessoas sobre o que é um fundador bem-sucedido, porque na cabeça delas é um homem excêntrico. E é ainda mais desafiante angariar capital sendo mulher”, lamenta.
Leia também | Feminismo digital: à procura de igualdade no mundo da tecnologia
Hanna admite que podia ter seguido o caminho mais fácil. “Com a minha experiência, podia ter uma vida incrível, ganhando dinheiro a trabalhar para os outros”. Por acreditar no sonho, escolheu ir à falência. “A sociedade leva a sério as loucuras de homens empreendedores como Elon Musk ou Richard Branson. E eu quero provar que as mulheres também podem cometer loucuras e não devem ter de andar de saltos e saia travada para serem levadas a sério. Quero muito acabar com essa imagem”, destaca.
Hanna Aase admite que a pressão para ter sucesso é grande. “Sacrifiquei tudo pela minha empresa, assumi enormes riscos financeiros. Para mim, o Wonderloop é tão importante como produto como para passar a minha mensagem. Uma mulher na tecnologia tem de trabalhar 10 vezes mais para alcançar o mesmo resultado que um homem. É por isso que somos tão poucas. Espero ser um exemplo para as próximas gerações. Tal como Oprah foi para mim”.
“A internet abriu um mundo de possibilidades para o emprego de sonho”