Chegou sem avisar e já conta com 1,7 milhões de utilizadores em Portugal. Se ao início era mais usada pelos jovens, o TikTok chama agora a atenção das marcas, interessadas na base de utilizadores em expansão, especialmente durante a pandemia.
Mesmo quem nunca usou o TikTok sabe como funciona ou, por estes dias, já viu alguns vídeos feitos por lá, que saltam fronteiras entre redes sociais, aterrando no Instagram ou no Twitter. Com recurso a filtros, música ou efeitos, a plataforma permite a criação de vídeos curtos, reproduzidos de forma automática. Os números não mentem: criada para o mercado chinês, onde está presente deste 2016 com o nome Douyin, a rede social internacionalizou-se com o nome TikTok em 2017, com um total de 800 milhões de utilizadores globais (dados Datareportal).
Os números de utilizadores do TikTok em Portugal ainda são modestos quando comparados com o mercado internacional: 1,7 milhões de utilizadores. Mas a cifra está em expansão devido ao isolamento social. A imagem de marca da rede social são os desafios e danças coreografadas para reprodução instantânea que rapidamente se tornam virais. Com mais tempo à disposição dos portugueses, os desafios são adotados rapidamente e as versões multiplicam-se, muitas vezes com a presença de toda a família.
Cristina Figueira, digital account manager da Azerion, empresa que gere a comercialização de publicidade em plataformas e jogos, incluindo o TikTok, nota que a rede social está a crescer por estes dias e que a faixa etária dos utilizadores também está a mudar. “Tem vindo a crescer em tráfego e utilizadores e o perfil mudou também ligeiramente, talvez pela situação que estamos a viver, e também porque esta é uma dinâmica que agrada aos adultos.” Comparando com janeiro, a empresa nota já um aumento de tráfego de 30%.
Se inicialmente o conceito do TikTok causava alguma estranheza e curiosidade entre os adultos, rapidamente as coisas mudaram. Cristina Figueira nota que já desde o final de dezembro que foi notada uma mudança. “Antes achavam estranho, mas agora já há muitos adultos a participar. Primeiro para perceber o que é que os miúdos estão a fazer e depois porque a demografia também mudou.”
A responsável da Azerion detalha que, em Portugal, o TikTok é uma rede social mais feminina: “Temos cerca de 34% [de utilizadores] entre os 14 e os 18 anos e 39% dos 19 aos 24 anos”, avança Cristina Figueira, mencionando dados de fevereiro deste ano. A faixa etária começa a mudar, contrariando as ideias de que o TikTok era apenas uma moda entre os adolescentes.
A partir do momento em que a rede social chinesa começa a atrair utilizadores também começa a atrair marcas, interessadas nas plataformas onde o público está. Na última década isto tem acontecido com as plataformas digitais – primeiro com o YouTube e Facebook e, mais tarde, com o Instagram. “Há marcas a apostar no TikTok como sendo uma comunicação estratégica para atingir os targets”, explica Cristina Figueira, exemplificando com marcas do setor alimentar, da área da tecnologia, entretenimento e também as operadoras móveis.
“Estão a pedir-nos mais campanhas para o TikTok, porque sabem que as pessoas estão a usar mais a plataforma”, explica a responsável da Azerion, que gere campanhas em várias plataformas. “O entretenimento está a crescer exponencialmente e é um ambiente onde não há notícia [sobre o vírus], que as pessoas já estão a ficar um bocadinho cansadas. Na área do entretenimento estão mais recetivas para receber publicidade porque estão mais descontraídas”, explica.
Mas criar para o TikTok não é o mesmo que desenvolver conteúdo para outras redes sociais. “Muitas vezes são campanhas mais curtas, com menos tempo de duração”, diz Cristina. Sérgio Meireis, da agência de criação de conteúdos Cheese Me, também destaca a criatividade como um ponto-chave para uma estratégia bem-sucedida no TikTok.
“As marcas que queiram estar presentes no TikTok têm de ter uma linha orientadora à sua presença. É um fenómeno onde é possível criar desafios e onde há tanta coisa que é possível fazer”, explica o business manager da Cheese Me. Ainda em 2019, a agência lisboeta criou uma área dedicada à representação digital de criadores de conteúdos no TikTok. “É um investimento e percebemos que tínhamos de alocar recursos para criar estratégias em TikTok”. Neste momento, a agência já tem 90 pessoas ativas em colaborações com marcas na rede social; no total, assegura a representação digital de cerca de 150 TikTokers – os criadores que trabalham este tipo de plataforma.
Para a agência, esta é uma rede social que chama já a atenção das marcas, numa altura em que os desafios feitos na app se tornam virais e o consumo de conteúdo digital aumentou. E há margem para crescimento, avisa. “É uma rede onde há muito consumo, e onde ainda faltam criadores”.
Sérgio Meireis explica que chama a atenção na rede social quem tem o “melhor perfil e conteúdo”, não fugindo à regra de outras plataformas. Em Portugal, explica que os criadores “crescem e com velocidade, há um crescimento muito rápido dos perfis”, mas que tal é “justificado com os conteúdos”, numa rede social que privilegia a criatividade e espontaneidade. A Chesse Me detalha que criar conteúdos para o TikTok exige outro tipo de conteúdos e que “a curadoria do conteúdo em TikTok é diferente da curadoria do YouTube”, por exemplo.
A agência não fala em valores de campanhas, por questões de confidencialidade, mas refere que se trata do “esforço associado à criatividade e desenvolvimento de conteúdo”. “A forma como tratamos a questão da remuneração é com muita seriedade, porque sabemos que aquela publicação pode chegar a milhares de pessoas mas antes teve um esforço grande do criador na área da criatividade.”
“Podemos assumir que no YouTube o conteúdo é mais caro do que em TikTok, mas isso não quer dizer que não haja esforço no TikTok, há um esforço criativo diferente. Se tivéssemos de colocar por pontos, uns compensam os outros”, resume Sérgio Meireis.
Há quem ‘nasça’ no TikTok e há quem ‘salte’ entre redes
Há criadores de conteúdos no TikTok que nascem exclusivamente na plataforma, praticamente sem presença noutras redes sociais. “Um ano e meio de TikTok e há quem tenha milhões de visualizações nos vídeos”, aponta Sérgio Meireis. Aos 17 anos, Filipe Vaz é um dos exemplos de criadores dedicados ao TikTok, onde soma já 169 mil seguidores e 5,4 milhões de ‘likes’ nos vídeos. David Brás é outro exemplo, somando mais de 177 mil seguidores e 12,2 milhões de likes no TikTok.
Mas há também quem já tenha território conquistado em plataformas como o YouTube ou Instagram e que não resista a espreitar o que se passa na rede social de vídeos curtos. A influenciadora digital e empresária Mafalda Sampaio explica ao Dinheiro Vivo que começou a dar mais atenção ao TikTok no final do ano passado. “Não percebia muito bem o conceito da app mas rapidamente percebi que era engraçada e divertida”.
Atualmente, faz vídeos diários para o TikTok, onde já tem 99 mil seguidores e mais de 587 mil likes nos vídeos. “Quanto já tens uma audiência numa plataforma digital fica mais fácil ganhares audiência em outras plataformas, porque já trabalhaste a notoriedade e o crescimento de público e acabas por ter mais um trabalho de redirecionamento de seguidores. No entanto, o TikTok tem tido um impacto gigante nos últimos meses e deixou de ser uma rede social só para os mais novos”, resume, explicando que praticamente todas as redes começam assim. “O TikTok não foi exceção, mas agora acho que tanto miúdos como graúdos estão a reconhecer as potencialidades daquilo e o crescimento que está a ter. Claro que o facto de estarmos todos em isolamento social ajudou a que mais e mais pessoas aderissem”, reconhece.
Mafalda destaca que é uma “ótima ferramenta para estar em contacto com o público, sem dúvida”. A influenciadora digital explica que “já teve propostas de conteúdos direcionadas para o meu TikTok, porque tenho lá também uma audiência considerável já, quase cem mil pessoas, com um crescimento diário.” Para a também fundadora da revista Maria Vaidosa, “as marcas comunicam onde estão as pessoas e por isso o TikTok é uma ferramenta a considerar”.
Durante o dia, Mafalda Sampaio partilha vídeos no TikTok, muitas vezes feitos em família. O desafio de ser mais criativa tem agradado, mas reconhece que é um mundo diferente do YouTube ou Instagram, por onde passa muita da sua atividade profissional. “Vive muito à base de coreografias, de voice overs, é uma rede social extremamente dinâmica e ativa pelo tipo de conteúdos que ‘exige’ pois é preciso aprender as danças, ou decorar o ‘guião’ do que se vai dizer, mas, por exemplo, não requer o tempo de edição ou de aperfeiçoamento que um canal de Youtube requer. Por isso é preciso, sim, uma adaptação por parte das pessoas, porque as fotografias ou os Stories do Instagram não vão servir para aqui. No entanto, é um desafio engraçado que tenho gostado de explorar e que me tem dado imenso gozo, e o feedback está a ser bastante positivo.”
Já a cantora e influenciadora Bárbara Bandeira, que na semana passada atingiu a marca de um milhão de gostos no TikTok, não é uma estranha para esta plataforma digital. “Antes de ter esse nome era a Musical.ly e eu já tinha uns dois ou três vídeos”, detalha, recordando a história da plataforma. Em 2019, a ByteDance, a empresa chinesa dona do TikTok, adquiriu a plataforma Musical.ly, fazendo com que todos os utilizadores migrassem automaticamente para a nova rede social. “Mas só mais ou menos há um mês, devido a esta quarentena, é que comecei a ligar e a perceber mais a magia da aplicação. E desde aí que fiquei viciada”, confessa, referindo que “tem sido uma ótima terapia”.
Bárbara reconhece que “criar uma audiência nunca é fácil”, mas que “está a adorar usar o TikTok”. “É um tipo de comunicação diferente, mais divertido, mais criativo até, não é a típica foto ou selfie. Há cada vez mais figuras públicas e influencers a juntarem-se a esta rede – tanto os mais novos como os adultos – portanto é uma questão de tempo até as marcas portuguesas seguirem as tendências do mercado e começarem também elas a desenvolver estratégias connosco no TikTok.”
Destaca que a rede social disponibiliza “opções e ferramentas que mais nenhuma rede social tinha até agora”, algo que, na sua opinião explica o sucesso da app. “Tendo coisas novas para utilizar, os conteúdos acabam também por ser diferentes.” Como tem sido visto nos últimos dias, aquilo que acontece no TikTok não fica só no TikTok, com os conteúdos a saltarem entre as redes sociais. “Todos nós fazemos uma utilização dos nossos TikToks no Instagram e em outras redes, não só porque queremos potenciar esses conteúdos mas também porque queremos fazer saber aos nossos seguidores que também estamos lá.”
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